O escritor Milan Kundera dizia que a luta contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento. Por isso, o Brasil não pode esquecer jamais de uma das páginas mais infames e covardes de sua história: o famigerado Ato Institucional no. 5 (AI-5), decretado há exatos 50 anos, em 13 de dezembro de 1968. O AI-5 foi uma inflexão ainda mais violenta e autoritária dentro do regime ditatorial implantado em 1964, que já havia quebrado a ordem constitucional com a deposição do presidente João Goulart.
O ato vigorou até dezembro de 1978, produzindo um elenco de ações arbitrárias de efeitos duradouros e dando poder de exceção aos governantes, que poderiam punir os "inimigos" do regime sob quaisquer pretextos e sem limites ou responsabilidades em termos de violências e torturas físicas e mentais. "Às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência", foi a frase do então ministro do Trabalho e da Previdência Social Jarbas Passarinho, durante a reunião preparatória do AI-5.
Entre os poderes ilimitados do presidente da República, estavam o de determinar o recesso de todos os parlamentos do País - com a conseguinte transferência das funções legislativas para o poder executivo; decretar a intervenção em estados e municípios, sem as limitações previstas na Constituição; suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos pelo prazo de 10 (dez) anos e cassar mandatos federais, estaduais e municipais; e decretar o estado de sítio, fixando o prazo de sua duração.
"Meio século nos distancia do AI-5, uma das peças mais autoritárias em matéria de direito e de política na história brasileira", afirmou o deputado estadual Renato Roseno (PSOL) em pronunciamento realizado na manhã desta quinta-feira, no plenário da Assembleia Legislativa do Ceará. "Estamos hoje aqui num parlamento, com diferentes vozes e diferentes posições ideológicas. Pois o AI-5 permitia que um simples ato do presidente decretasse o nosso recesso parlamentar. O AI-5 poderia tirar arbitrariamente o meu direito de votar e ser votado. O direito e a garantia de habeas corpus cessariam. Pior: eu não poderia sequer ter acesso à apreciação judicial".
Em linhas gerais, com sua receita que misturava censura generalizada à imprensa e às artes e repressão no campo das liberdades individuais e políticas, o AI-5 representou a negação daquilo que é base de um sistema político democrático: pluralismo político e participação ampla; respeito às garantias fundamentais e aos direitos humanos; e o pleno vigor do estado de direito, traduzido no respeito à legalidade, à igualdade perante a lei e à previsibilidade das consequências jurídicas das condutas, bem como na inafastabilidade do controle jurisdicional.
Segundo o parlamentar, a passagem dos 50 anos do ato institucional no. 5 nos obriga a lembrar e homenagear todos os homens e mulheres que foram torturados e que morreram nos porões da ditadura por defender a democracia. "Pessoas que foram torturadas em suas almas e em seus corpos", destacou o deputado. "Se hoje um deputado de esquerda pode ocupar um espaço nesse parlamento, se temos uma constituição que completa 30 anos e que tem em seu artigo quinto um pilar dos direitos e garantias fundamentais, se hoje nós podemos votar, se podemos reclamar direitos na esfera judicial, é porque muita gente colocou a vida em risco e padeceu lutando pela democracia e contra a ditadura. AI-5 nunca mais!"
Confira o pronunciamento de Renato Roseno sobre os 50 anos do AI-5: https://www.facebook.com/RenatoRoseno50/videos/273142480064701/