'A energia certa não pode ser feita do jeito errado', reforça Renato

04/04/24 16:07

Com o avanço das mudanças climáticas é necessário reduzir a emissão de gases do efeito estufa (GEE) com a utilização de geração energia com fontes renováveis, como solar, eólica, hidroelétrica, geotérmica e biomassa. Entretanto, essa transição energética não tem sido justa para todos. Por isso, o deputado estadual Renato Roseno (Psol) tem promovido iniciativas para evidenciar os problemas e melhorar a qualidade dos territórios afetados pelo avanço desses projetos.

Segundo a pesquisadora Helena Verdolini, da Universidade de Brescia, projetar uma transição energética justa requer esforços globais em vários níveis. “Exige cientistas, formuladores de políticas e o setor privado sentados à mesma mesa. Precisa dar voz a cada um dos setores da sociedade”, defende a professora. O termo "transição energética justa" surgiu na década de 1980 por sindicalistas dos Estados Unidos que estavam endurecendo as regulamentações ambientais e fechando setores poluentes, como a produção de amianto ou produtos químicos, assim como garantindo que pessoas não ficassem sem emprego ou moradia.

O nosso mandato luta para que a transição energética aconteça, respeitando a biodiversidade, garantindo a qualidade de vida dos moradores das comunidades afetadas pelos empreendimentos, e, ao mesmo tempo, gerando emprego, inclusão social e combatendo as desigualdades. “Não podemos trazer a energia certa do jeito errado, impactando os ecossistemas marinhos, afetando a pesca artesanal e causando um prejuízo imenso às centenas de comunidades”, reforça Roseno.

No Ceará, alguns casos mostram que o modelo atual adotado vão na contramão de uma transição justa. Por exemplo, a comunidade de Córrego dos Nunes, em Itarema, está situada a apenas um quilômetro de distância do Parque Eólico da Cajucoco. Com isso, os residentes enfrentam diversos transtornos, especialmente durante a noite, devido ao barulho causado por atividades como o transporte, a indústria e o comércio. Mulheres idosas relatam distúrbios do sono, fadiga física e a necessidade de medicamentos para controlar a insônia, a ansiedade e o estresse após o início das operações do parque.

Outro exemplo é o de Acaraú, no interior do Ceará, onde há várias décadas diversas comunidades de pescadores têm praticado a pesca artesanal como meio de subsistência. Isso representa não apenas uma tradição cultural, mas um meio de sustento econômico para as famílias. No entanto, nos últimos anos, a região tem sido alvo de intensa especulação econômica devido à chegada de empreendimentos eólicos.

Com condições favoráveis, como ventos abundantes e infraestrutura de transmissão de energia, esses projetos frequentemente buscam ocupar áreas que coincidem com os territórios tradicionais das comunidades pesqueiras. A ameaça mais recente vem através dos acordos previstos para instalação das chamadas eólicas offshores — dentro do mar — para produção de hidrogênio verde. Isso pode representar um sério risco à subsistência dessas famílias, que dependem da pesca para sobreviver. “Este hidrogênio é verde pra quem? Ele é verde para as comunidades tradicionais? Nós achamos que é necessário ter cuidado para que isso não venha a fazer sofrer os territórios”, acrescenta.

Atualmente, há 74 projetos de torres eólicas no mar pré-cadastrados na plataforma do Ibama para todo o país, de acordo com o último mapeamento divulgado pelo órgão, em março do ano passado. A maior parte está no Ceará e no Rio Grande do Sul (22 pedidos para cada estado). “A gente já sofre com a eólica fora do mar, avalie dentro do mar. Como esse povo vai trabalhar e sustentar sua família?, preocupa Beto Pescador, da Reserva Extrativista Canto Verde, em Beberibe.

Contradição

Na medida que avança na instalação de empreendimentos de fontes renováveis, o poder público segue apoiando projetos que estão em evidente contradição com a transição energética, como as termelétricas. Em Santa Quitéria, região semiárida do Ceará, urge um novo risco: a mineração. A expectativa é de que serão necessários 119 carros-pipa de água doce por hora para a extração de fosfato e urânio, este último para produção de energia nuclear. “Isso não é transição, porque transição é quando você desliga suja e liga coisa limpa” afirmou Renato Roseno durante o seminário “Transição ou Transação Energética?”, que aconteceu no dia 3 de abril, na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará (Alece).

Iniciativas

Garantir uma transição energética justa é um dos grandes desafios do nosso mandato. Nos últimos anos, intensificamos as iniciativas para que isso se torne realidade. Uma delas é o projeto de lei nº 184/2023, que reconhece este estado de emergência e prevê a criação de políticas de transição sustentável e um plano de enfrentamento à crise ambiental.

A proposta foi apresentada, inicialmente, no nosso segundo mandato, em 2021. Sem avançar no parlamento, a iniciativa foi desarquivada na atual legislatura. Nela, além de reconhecer a grave emergência climática, define que o Ceará adote todos os esforços, como a realização da transição para matrizes energéticas socioambientalmente sustentáveis e neutras em emissões de gases de efeito estufa. O projeto define também que o poder executivo estadual deve elaborar um Plano Estadual de Enfrentamento à Emergência Climática, delineando metas quinquenais até 2050.

Mais recentemente, também estivemos na articulação da Mesa de Diálogo Energia Renovável: direitos e impactos, promovida pela Secretaria Geral da Presidência da República, entre 18 e 21 de março. O encontro percorreu os municípios de São Benedito, Camocim, Acaraú e Amontada. Por fim, a comitiva culminou suas atividades em Fortaleza, no Complexo das Comissões da Alece.

As atividades da Mesa incluíram visitas de campo, escutas, reuniões junto às populações afetadas e/ou ameaçadas pela implantação de empreendimentos de energias renováveis, como usinas eólicas onshore e offshore, usinas solares, plantas de hidrogênio verde e linhas de transmissão de energia. “Se aceitarmos esse projeto, será o maior desastre ambiental, social e humano”, alertou o pescador Francisco Ivan de Souza, se referindo às eólicas no mar.

Outra importante proposta que apresentamos foi o projeto 138/2023, que estabelece normas e critérios básicos de precaução e preservação do solo, do meio ambiente, fauna e flora, proteção e defesa da saúde, mediante combate preventivo e controle da poluição, conservação da natureza e práticas de manejo dos recursos naturais para as presentes e futuras gerações. Nele, também propusemos estabelecer restrições à exploração de rocha fosfática com urânio associado e derivados. Infelizmente, foi rejeitado.

Áreas de atuação: Meio ambiente