São quatro anos de luta pela reforma agrária e por justiça social no campo. Quatro anos de resistência à indústria do agrotóxico e às investidas do agronegócio e do poder econômico. O aniversário do acampamento Zé Maria do Tomé, realizado no último sábado (5), em Limoeiro do Norte, na Chapada do Apodi, foi uma celebração do legítimo direito de centenas de famílias ao trabalho, à terra e à água.
Debaixo do barracão do acampamento, uma bandeira do MST tremula e anuncia aos visitantes: aquele é um território livre do analfabetismo. A mensagem avisa da conquista dos acampados, mas também provoca o agronegócio e seus poderosos defensores, que não suportam a ideia de uma reforma agrária popular feita pelas mãos de um povo autônomo, livre e auto-organizado.
“O dia de hoje é um dia de festa. Quantas vezes eles quiseram tirar o povo daqui? Quantas vezes eles quiseram voltar com o veneno? Quantas vezes eles disseram que a água só podia ser deles, que a água não podia ser dos assentados, que a terra só podia ser deles”, afirmou o deputado licenciado Renato Roseno (PSOL), que esteve presente ao evento. “Nós estamos dizendo aqui, que a terra e a água não podem ser mercadoria, que o sangue do Zé Maria não caiu em vão. Esse sangue é o sangue da luta, que nos inspira e nos dá força”.
Criado em 2014, com o apoio de entidades como MST, Cáritas Diocesana de Limoeiro, FAFIDAM/UECE e Núcleo Tramas da UFC, o acampamento reúne hoje cerca de 200 famílias que trabalham diretamente com a agricultura familiar numa área do perímetro irrigado Jaguaribe-Apodi. Entretanto, uma ação de reintegração de posse, impetrada pelo Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), ameaça essas famílias de despejo.
O nome é uma homenagem ao agricultor e ambentalista Zé Maria do Tomé, assassinado em 2010, com mais de 20 tiros, por conta de seu envolvimento na luta contra a pulverização aérea de agrotóxicos na região. “Zé Maria morreu porque lutava contra o veneno que os aviões despejam por aqui no Apodi. E mais do que isso. Ele lutava por terra e por água. Por isso nós temos de render homenagens à memória dele”, defendeu Renato.
“Dos nossos acampamentos, não brotam apenas alimentos sem veneno, mas brota esperança, brota justiça, brota um novo país, um novo mundo, uma nova sociedade, é disso que os assentamentos da reforma agrária são feitos. São homens e mulheres que plantam com suas próprias vidas a esperança, a paz e a justiça”, afirmou.
Desde o ano passado, diversas entidades da sociedade civil se manifestaram em defesa das famílias do acampamento, pedindo ao governo do Estado, ao governo federal e ao DNOCS a reconsideração do pedido de desocupação da área, o que garantiria àquela população seu legítimo direito à terra.
“Qual o crime cometido pelas famílias do Acampamento Zé Maria do Tomé? Que tipo de ameaça aqueles pequenos agricultores familiares representam? O uso sustentável da terra e da água como forma de dar dignidade aos filhos? A luta pela subsistência com respeito ao meio ambiente? A contribuição com a pequena economia local, amplamente reconhecida por instituições religiosas, técnicas e universitárias?”, perguntava uma nota lançada por essas entidades em outubro de 2017.
Segundo Renato, o acampamento é um lugar de grandes conquistas e também de muito aprendizado. “Esse aprendizado do chão da terra é muito importante. Essa pedagogia a luta, que é a melhor pedagogia que existe. Ninguém tem ensinamento melhor que esse”, afirmou. “Nesses 500 e tantos anos de história do Brasil, nunca houve reforma agrária porque a burguesia e o grande latifúndio nunca quiseram que o povo tivesse soberania sobre o território. É por isso que nos acampamentos dos Sem Terra se produz algo que nunca se produziu nos 500 anos do Brasil, que foi justiça”.