Com a demanda de dialogar sobre a Família Acolhedora, uma modalidade de serviço de acolhimento para crianças e adolescente que se encontram com direitos violados, o mandato É Tempo de Resistência (deputado estadual Renato Roseno - PSOL) e a Comissão de Infância e Adolescência da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará realizaram, no dia 1 de novembro, atividade para debater o programa. Com a presença do poder público, de entidades e movimento sociais, recebemos o Juiz Sérgio Kreuz, da Comarca de Cascavel, no Paraná. Especialista no tema e principal articulador do programa em seu município, ele apresentou a experiência bem sucedida do Programa de Família Acolhedora em Cascavel.
A família acolhedora é aquela que, voluntariamente, acolhe em seu espaço familiar a criança ou o adolescente em situação de risco pessoal e/ou social que, para ser protegida, foi afastada do seu meio familiar e comunitário. Tem como objetivo garantir às crianças e aos adolescentes afastados temporariamente da família de origem, uma alternativa de acolhimento às instituições, favorecendo o direito à convivência familiar e comunitária (como assegurado pela Constituição no art. 227), a reintegração em sua família de origem ou extensa. Crianças e jovens afastados temporariamente de suas famílias biológicas pelo Poder Público passam a ter como alternativa lares de famílias voluntárias, cadastradas no programa. A proposta tem o objetivo de reintegrar esses meninos e meninas a uma convivência familiar e comunitária, por período determinado.
"Esse modelo de Família Acolhedora é um grande desafio imposto para nós na melhoria dos direitos das crianças. Nós estamos vindo de um modelo de acolhimento institucional que vem desde o tempo da colonização, mudar essa realidade não é fácil. Embora todos nós que trabalhamos com a infância temos a consciência do mal que esse acolhimento possa fazer, é o sistema que não permite que essa criança desenvolva esses laços de afeto. Temos menos de 5% de acolhimento familiar no Brasil, embora a Lei de 2010 diga que esse acolhimento deva ser prioritário, como mudar essa realidade? Estamos aqui para debater isso. O acolhimento prolongado causos danos irreversíveis, danos motores, institucionais. E as crianças que vivem na instituição, aquelas que já cresceram e que possuem problemas de saúde e estão fora do perfil de adoção? O acolhimento familiar garante mais dignidade", afirma o juiz.
Para Sérgio Kreuz, várias são as vantagens do Acolhimento Familiar: garantia de um ambiente familiar e tratamento mais individualizado. "Temos, dentro do programa, famílias de todos os tipos, mães solteiras, casais heteros e famílias homoafetivas, um dos membros tem que estar empregado, embora se pague uma bolsa auxilio, ele é voluntário, não pode estar escrito no cadastro de adoção. E, principalmente, não podemos dar esperança que a criança será adotada. Tudo isso é muito delicado, sabemos disso. O que torna o programa de altíssima complexidade, sabemos que ele é complexo, depende de uma rede, ainda há muita resistência, muito desconhecimento, muita complexidade e problemas com o novo. Hoje muita gente, inclusive juízes e promotores e gestores públicos, resistem à esses novos modelos e posso dizer que nós também, lá no Paraná, sofremos essas resistências", aponta o juiz.
Colaborando no debate, o deputado Renato Roseno destacou a importância dessa discussão. ''É necessário difundir essa ideia tanto nas instituições, nas famílias, quanto para os gestores públicos, para fortalecer a modalidade de acolhimento familiar no Ceará. Precisamos ampliar essa modalidade porque é melhor para a criança, melhor afetivamente e melhor para o seu desenvolvimento. Existe uma minuta de lei na Procuradoria Geral do Estado instituindo o acolhimento familiar no Ceará. O próximo passo seria o envio do texto para o Governo do Estado, que, por sua vez, enviaria para análise na Casa Legislativa", afirma o parlamentar do Psol.
Representando o Poder Público, a orientadora da Célula de Atenção à Alta Complexidade da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), Rita de Cássia Sidney Marques, afirma que atualmente existem 13 abrigos ligados à Secretaria. "Ao todo, 417 crianças e adolescentes são assistidos por essas unidades. Mas a Família Acolhedora não existe ainda no Ceará, queríamos começar como Projeto Piloto junto ao Ministério do Desenvolvimento Social (MDS). O Estado é responsável pela execução desses serviços, para isso foi preciso que a gente pensasse formas de gestão para os abrigos institucionais. Começamos a chamar os municípios e levar a proposta e sensibilizar, municípios resistiram muito. Conseguimos formar 8 regiões prioritárias para o abrigo institucional e 3 para família acolhedora (Araripe, Guaramiranga e Barroquinha). Construímos uma comissão intersetorial, vamos para a 9ª reunião e estamos debatendo com muita qualidade o tema", afirma Rita de Cássia.