A tecnologia a serviço da democracia. No fim do mês de junho, o governador Camilo Santana sancionou a lei 16.911/19, de autoria do deputado Renato Roseno (PSOL), que autoriza, em âmbito estadual, a assinatura eletrônica certificada em projetos de iniciativa popular. A ideia, segundo o parlamentar, é simplificar os processos de mobilização em torno da criação de propostas legislativas, permitindo a subscrição parcial ou total dos projetos de iniciativa popular por meio de assinatura digital devidamente certificada.
"Nós precisamos dar outra qualidade ao processo legislativo, aproximando a sociedade cearense do seu parlamento. Por isso, precisamos facilitar a utilização de instrumentos de participação popular na elaboração de leis, que é o pilar do sistema democrático", defende Renato.
Nacionalmente, a população pode enviar projetos de lei de iniciativa popular para a Câmara dos Deputados, sendo necessária, conforme critérios previstos na Constituição Federal, a assinatura de um por cento do total eleitores (cerca de 1,4 milhões de pessoas), distribuídos por pelo menos cinco estados da Federação - com, no mínimo, três décimos dos eleitores em cada um deles.
Apesar da previsão constitucional, apenas quatro projetos originalmente de iniciativa popular viraram lei ao longo dos últimos trinta anos. Ainda assim, essas iniciativas tiveram dificuldade em alcançar o número de assinaturas necessárias - e validá-las - e acabaram sendo apresentados por parlamentares como propostas próprias e foram apreciados seguindo o rito de um projeto de lei comum. Em todos os casos, a Câmara dos Deputados alegou não ter estrutura para conferir a autenticidade das assinaturas apresentadas.
"A iniciativa popular de lei depende de assinaturas físicas, com o título de eleitor, conferidas em cartório para atestar a veracidade das mesmas, para confirmar que aquela pessoa que assinou estava, de fato, no exercício, de sua condição de eleitor", explica Renato. "Inspirados pelos novos mecanismos e tecnologias de democracia digital, nosso projeto de lei determina que a assinatura eletrônica sirva para a iniciativa popular de lei no Ceará".
No Ceará, o artigo 6o. da Constituição Estadual também prevê a possibilidade de apresentação tanto de projetos de lei quanto de emendas constitucionais de iniciativa popular mediante assinaturas de um por cento do eleitorado cearense, distribuído por pelo menos cinco municípios - com não menos de 0,3% dos eleitores de cada um deles. Como o Estado conta atualmente com cerca de 6,3 milhões de eleitores, seriam necessárias 63 mil assinaturas. Com a proposta de Renato, essa coleta de assinaturas poderá se dar de forma digital, com a devida certificação, o que vai facilitar a apresentação de iniciativas do gênero.
"No nosso estado, a população também pode dar início a processos legislativos, mas isso nunca foi feito. Nunca houve um iniciativa popular de lei que tenha tramitado como tal aqui na Assembleia Legislativa", explica Renato, que, em 2017, foi autor do requerimento de uma audiência pública realizada pela Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) da Assembleia Legislativa e que teve como tema "Tecnologia da Informação e Democracia Participativa".
Para o parlamentar o PSOL, esse tipo de proposta não diminuirá o papel do parlamento, que continuaria sendo um espaço de discussão, de deliberação e de validação das proposições legislativas. "Esse tipo de iniciativa melhora a democracia, democratiza a democracia, porque melhora a participação da cidadania e da sociedade na proposição de ideias, ideias que chegariam ao parlamento pela lavra da própria população", defende.
Segundo Renato, a incorporação das novas tecnologias voltadas à informação por parte do Poder Legislativo é condição para que se possa ter uma aproximação efetiva entre os representantes do povo e a própria sociedade civil. Segundo o parlamentar, a discussão sobre o fortalecimento da democracia participativa em nosso país e no Ceará deve ser feita simultaneamente com a busca de novas tecnologias de interação social.
Um exemplo de tecnologia que pode contribuir para esse fortalecimento é o aplicativo “Mudamos”, desenvolvida pela empresa ITS Rio, um instituto de pesquisa independente e sem fins lucrativos. Lançado em 2014 como uma plataforma colaborativa para solucionar desafios de interesse público, seu objetivo é criar um debate informado através da participação de amplos setores da sociedade civil, utilizando a tecnologia para convocar a população a encontrar respostas para problemas sentidos pela coletividade. Entre outros recursos, a utilização do aplicativo facilita a coleta de assinaturas para a propositura de projetos de iniciativa popular. (Texto: Felipe Araújo / Foto: Fabio Pozzeboom - ABr)