Chacina em Messejana: Renato Roseno volta a cobrar respostas efetivas às famílias das vítimas e à sociedade

11/12/15 18:00

Deputado Renato Roseno na tribuna da Assembleia Legislativa

No dia em que a chacina de Messejana, a maior já registrada no Ceará, completa um mês, o deputado estadual Renato Roseno (PSOL) volta a exigir respostas efetivas às famílias das vítimas e à sociedade cearense. Em pronunciamento na Assembleia Legislativa nesta sexta-feira, 11 de dezembro, ele prestou apoio e solidariedade aos familiares das 12 pessoas assassinadas e cobrou um resultado do Governo do Estado.

"O que está sob risco é a autoridade do Estado do Ceará. Nós não podemos autorizar que agentes de segurança pública, mesmo que movidos por vingança, utilizando-se inclusive da sua condição de agentes do Estado, executem pessoas, promovam extermínio. O que está sob investigação não é só a autoria de tais crimes, mas a capacidade do Estado, do senhor governador, do secretário, da Controladoria Geral de Disciplina, de responder à sociedade cearense e dizer: aqui não virou terra de ninguém", afirmou o parlamentar, sem deixar de reconhecer a complexidade do inquérito policial.

Renato Roseno citou as notícias veiculadas pelos jornais locais sobre a ampliação do prazo para a conclusão do inquérito policial, solicitada pela Controladoria Geral dos Órgãos de Disciplina, por meio da Delegacia de Assuntos Internos. É a mesma a dizer que a investigação já aponta ação de policiais e que a tese de que os crimes foram cometidos por agentes públicos de segurança se fortalece a cada nova informação. "Isso só aumenta a gravidade desse massacre, dessa chacina", conclui o deputado.

O parlamentar do PSOL voltou a lembrar que nada justifica as execuções e que os mortos não tinham envolvimento com narcotráfico ou crime organizado nem passagem pela Polícia em situação mais grave. De acordo com as informações oficiais, os únicos delitos atribuídos a três vítimas eram por falta de pagamento de pensão alimentícia, infração no trânsito e ameaça.

"Nada autoriza um morticínio, nada autoriza uma execução, nada autoriza a nossa desumanização e a nossa brutalidade. Quando nós entramos numa lógica de 'olho por olho, dente por dente', lógica de execução ou extermínio, está suspenso o Estado Democrático de Direito. O que está sob risco é inclusive a legitimidade da Segurança Pública. Quando a violação da lei é feita pelo agente da lei é qualitativamente mais grave, porque ela autoriza a sociedade inteira a matar", questiona Renato Roseno.

A linha de investigação que vem ganhando mais força é de que as mortes foram por vingança pelo assassinato de um policial militar na noite no dia 11 de novembro. Nas horas seguintes, entrando pela madrugada do dia 12, foram registrados os 12 assassinatos na região da Grande Messejana - no Curió, na Lagoa Redonda e no Guajeru. O soldado foi atingido por tiros em uma tentativa de assalto, no bairro Lagoa Redonda.

"Toda morte, de todo ser humano, merece o nosso lamento, a nossa indignação, o nosso repúdio, mas não queremos uma lógica de guerra instalada na nossa cidade; que a nossa Segurança Púbica, as nossas polícias, em especial, sejam instrumentalizadas nessa lógica de guerra, que só produz morte. Nós acabamos por ter, portanto, uma Polícia que morre muito e também que mata muito", reprova o deputado do PSOL.

Continuando na mesma linha de argumentação, Renato Roseno aponta que é de causar preocupação os dados oficiais da própria Secretaria Nacional de Segurança Pública que revelam um número de mortes de policiais em ação superior ao de mortes em latrocínios, por exemplo. "Isso é escandaloso. Nós já tivemos este ano quase 400 mortes de policiais no Brasil, 14 no Ceará. Portanto, essa lógica de guerra autoriza a morte, autoriza matar e morrer. É uma lógica de ocupação de guerra dos territórios urbanos, periféricos, pobres e que são sobretudo transformados em territórios de exceção. Lá não há Direito, não tem Constituição, não tem Estado Democrático. O que vale é a lógica da força".

Dignidade não pode ter CEP

Durante o pronunciamento em que relembrou a maior chacina já registrada no Ceará, o deputado estadual Renato Roseno pontuou que há uma cultura de violência instalada na sociedade cearense, sobretudo nos grandes centros urbanos, em especial onde ele chama de territórios de exceção. "Não existe Estado Democrático de Direito nesses territórios. Não existe devido processo legal, não existe contraditório, direito à vida, direito a um julgamento justo, direito à dignidade”.

Recorrendo ao companheiro de partido, Marcelo Freixo, deputado estadual do Rio de Janeiro pelo PSOL, Renato Roseno questiona a negação do direito a uma vida digna e sem violência em função do lugar onde se mora. "Ele tem uma expressão que eu acho muito reveladora: a dignidade no Brasil tem CEP. Dependendo do lugar onde você mora, você terá dignidade ou não terá dignidade. Nós não podemos viver desse jeito. A dignidade não pode ter CEP. Todos devem ter direito à dignidade".

O Ceará apresenta elevadíssimo número de homicídios, em especial de homicídios envolvendo jovens e adolescentes. "Somos o segundo estado em mortes de jovens no Brasil, de acordo com o Mapa da Violência. A nossa capital, Fortaleza, tem a triste marca de, num curto espaço de tempo, dez anos, ter chegado à condição de primeira capital em Índice de Homicídios na Adolescência no Brasil", aponta o deputado.

Fortaleza tem uma média de 77 homicídios em todas as faixas etárias para cada 100 mil habitantes ao ano. Na faixa etária de 12 a 19 anos, essa taxa passa para 136 homicídios por grupo de 100 mil habitantes ao ano. "Isso, sem dúvida alguma, é uma vergonha. Portanto, se instalou no nosso território uma lógica de banalização da morte. A morte ficou banal".

Na avaliação do parlamentar, a farta mídia policialesca, com mais de dez horas de programas televisivos por dia, mostra e concorre para a banalização da violência. "Ela chega todos os dias, em especial na hora do almoço, com imagens dessa tragédia nas periferias urbanas, em que são vítimas, sobretudo, jovens, na sua quase totalidade, negros, na sua quase totalidade, pobres, habitantes desses territórios. Portanto, Fortaleza vive uma situação de instalação de uma cultura de violência".

Problema multifacetado exige múltiplas ações

O deputado estadual Renato Roseno chama atenção para o problema estatístico, de achatamento da curva demográfica, em função da extensão e profundidade da violência. "Nós somos uma sociedade de uma cultura de violência instalada, enraizada profundamente. Inclusive, agora, passa a ser um problema estatístico demográfico. Tamanha é a morte, tamanha é a taxa de homicídio, em especial, dos mais jovens na nossa sociedade, que isso leva, portanto, a um achatamento da curva demográfica. Isso nos envergonha".

Estudioso das questões de segurança pública muito antes de chegar ao parlamento, como militante na área de direitos humanos, Renato Roseno tem a percepção da magnitude do problema da violência e das respostas que ele exige. "Eu sei que o problema é complexo, sei que ele é multifacetado, que há muitas causas. Portanto, o seu enfrentamento também demanda múltiplas ações, de variados níveis - federal, estadual, local, e que também, portanto, concorrem para a prevenção dos homicídios vários sujeitos".

Para os colegas parlamentares em plenário e para os ouvintes da Rádio Assembleia e telespectadores da TV Assembleia, o deputado do PSOL lançou a provocação: "Que futuro nós projetamos? Nós queremos um Ceará que vire uma terra de ninguém, um bang bang, ou nós queremos um Estado Democrático de Direito, uma segurança cidadã, uma redução de homicídios? Eu almejo a segunda alternativa”.

Luta da memória contra o esquecimento

A violência letal, sobretudo contra jovens e adolescentes, é motivadora da ação pública do deputado estadual Renato Roseno. No pronunciamento para lembrar os 30 dias da maior chacina que se tem notícia na história do Ceará, o parlamentar trouxe à memória a repercussão que os assassinatos causaram.

"Poucos eventos no Ceará foram tão violentos e poucos eventos no Ceará tiveram uma resposta internacional e nacional tão imediata. A Comissão Interamericana de Washington, logo na sequência da chacina, faz um comunicado à imprensa revelando a sua preocupação com esse fato. Entidades no Brasil inteiro assinaram manifestações cobrando do Ministério da Justiça, da Secretaria da Segurança Pública, a pronta resposta. O Conselho Estadual de Direitos Humanos emitiu também sua manifestação. Movimentos locais e nacionais de direitos humanos colocaram claramente, posicionam-se contra a lógica de guerra e de massacre", listou o deputado.

Ao menos 12 pessoas morreram entre a noite do dia 11 e a madrugada do dia 12 de novembro. "Concentrou-se num território, cujo raio é menor que três quilômetros, no Curió, na Lagoa Redonda e no Guajeru. Esse território concentrou num período de pouquíssimas horas, não mais que três horas, 12 eventos violentos, letais. O Ceará, naquele dia, amanheceu atônito".

Para o espanto não sucumbir com o tempo, Renato Roseno usou a tribuna da Assembleia Legislativa nesta sexta-feira, exatamente um mês depois do morticínio. "Sem dúvida alguma, eu não poderia deixar de me reportar a essa chacina por ocasião dos 30 dias do seu acontecimento". E para não esquecermos nem deixarmos esquecer, ele parafraseou Milan Kundera, escritor tcheco, autor de A insustentável leveza do ser, que registrou: "A luta do homem contra o poder é a luta da memória contra o esquecimento".

Áreas de atuação: Direitos Humanos, Justiça, Segurança pública