Por João Alfredo Telles Melo, advogado, professor e ex-deputado federal
A luta pelo Cocó já faz parte da história de Fortaleza. Amplas mobilizações levaram a que o poder público tomasse iniciativas no âmbito normativo. Em 1986, a prefeita Maria Luiza criou a Área de Proteção Ambiental (APA) do Vale do Rio Cocó. Os governos Tasso, que construíra, sob protestos, o Iguatemi por sobre aquele ecossistema, e Ciro decretaram áreas – de 700 a 1.100 hectares, para fins de desapropriação e criação do parque.
A APA nunca foi regulamentada e o parque não foi criado como Unidade de Conservação (UC), de acordo com a Lei 9.985/00. Partes do ecossistema, entretanto, passaram a ser protegidas: na gestão Luizianne, o Parque Municipal das Dunas e a APA de Sabiaguaba, em 2006, e a Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie) das Dunas do Cocó, de nossa autoria, em 2009.
Finalmente, após incessantes lutas do SOS Cocó, do Ocupe o Cocó e da cidade, o governador Camilo assinará o decreto de legalização do Parque, que – anunciam – terá 1.571 hectares. A poligonal se circunscreveu aos terrenos de marinha, evitando assim a inclusão de áreas privadas. Forjou-se um critério que tem inconsistências sob a ótica ambiental e que pode vir a ser produtor de injustiça socioambiental, além de favorecer a especulação imobiliária.
Áreas importantes do ponto de vista da conservação foram excluídas do decreto. Enquanto isso, nativos da Boca da Barra, em Sabiaguaba, e da comunidade da Casa de Farinha ficaram dentro da poligonal do parque (o que pode causar problemas aos usos e atividades sustentáveis dessas comunidades tradicionais, como a pesca, por exemplo). Após debates e embates, os primeiros, da Boca da Barra, foram garantidos provisoriamente no decreto, aguardando um estudo para serem reconhecidos como população tradicional (como se, de fato, já não o fossem, conforme o plano de manejo daquela UC!).
Por último, pergunta-se: onde está a Prefeitura de Fortaleza, anunciada pelo governo como parceira do parque, que se comprometera a transformar as dunas em zonas de preservação ambiental? O que pretende quando estuda a alteração do uso do solo da área para favorecer grandes loteamentos? Ou quando anuncia que tenciona mudar o plano de manejo de Sabiaguaba (que fora elaborado com a participação da comunidade)? O que vai ser do Cocó e da Sabiaguaba com tantas ameaças? O que se pode afirmar – com certeza – é que muitas lutas ainda nos aguardam para a real garantia dos direitos da natureza e dos povos do Cocó.
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