O Brasil vive hoje uma acirrada disputa de narrativa sobre sua história e sobre sua memória. Vozes reacionárias querem negar a escravidão dos negros, a ditadura, o papel da colonização portuguesa e outras terríveis marcas que nos formaram como nação. Querem reescrever o passado para legitimar e reforçar todo tipo de preconceito e intolerância.
Por isso, são tão importantes os investimentos em educação, cultura e, em particular, na preservação do patrimônio histórico. São políticas que fazem a sociedade refletir sobre ela mesma, se sensibilizar em relação à sua memória. Nesse sentido, infelizmente, o Brasil vive um cenário de terra arrasada em relação às políticas voltadas ao patrimônio: episódios como os incêndios do Museu Nacional e da Cinemateca Brasileira são emblemáticos do descaso oficial.
As elites dirigentes do Brasil parecem querer, intencionalmente, que o povo não tenha acesso à cultura e à educação patrimonial, coisas que revelam um espelho da nossa formação enquanto sociedade. Neste 17 de agosto, Dia Nacional do Patrimônio Histórico, queremos chamar atenção justamente para a importância da proteção de bens e equipamentos históricos e da defesa da nossa memória. Essa é uma luta permanente. Que se inicia no passado e nos orienta em relação ao futuro.
Fortaleza – Em Fortaleza, a situação do antigo Farol do Mucuripe é um dos exemplos mais gritantes da lógica do abandono do nosso patrimônio. Construído há 176 anos, o prédio é um dos patrimônios históricos tombados pelo Estado, mas não passa por uma restauração desde 1982. Nosso mandato tem acompanhado o caso, denunciando o descaso em relação ao equipamento por parte do poder público e destinando recursos através de emendas parlamentares.
No último mês de julho, uma audiência pública foi realizada no Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente e Planejamento Urbano de Fortaleza. Na oportunidade, a promotora de Justiça Ann Celly Sampaio cobrou a representantes do Estado ações de urgência a serem adotadas para o restauro e segurança do Farol. O caso está sendo acompanhado pelo MP por meio de um inquérito civil público instaurado.
Mas não apenas o Farol reclama ações de restauração e conservação. Ao longo do estado, são inúmeros os equipamentos e os bens culturais que necessitam de investimentos e políticas públicas. E essa é uma tarefa urgente na medida em que o abandono desse patrimônio representa o abandono do nosso próprio direito à memória. O esquecimento, nessas horas, só favorece o poder estabelecido e o projeto reacionário de apagamento das nossas identidades, de esgarçamento dos tecidos da memória.
Reescrevendo os versos de Caetano: por aqui, Narciso parece achar feio o que é espelho...
(Texto: Felipe Araújo / Foto: Divulgação MPE)