A tecnologia do drone fez explodir o número de casos de contaminação por agrotóxicos no Brasil. A denúncia foi feita hoje no plenário da ALECE pelo deputado estadual Renato Roseno (PSOL). Por serem equipamentos mais leves e de fácil acesso, eles estão se disseminando nas lavouras, são mais fáceis de armazenar - e por isso podem ser mais facilmente escondidos no caso de uma fiscalização - e estão também sendo utilizados como armas químicas em conflitos fundiários.
Relatório da Comissão Pastoral da Terra (CPT), produzido em conjunto com o Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc) e divulgado na última segunda-feira (2), traz dados do mapa anual sobre conflitos no campo. De acrodo com o relatório, os números relacionados à contaminação por agrotóxicos no primeiro semestre do ano explodiram: saltaram de 19 em 2023 para 182 em 2024, o que representou um aumento de mais de 950% em um ano.
"Essas contaminações nao são apenas acidente. Os latifundiários estão utilizando o drone como arma química", alertou Renato. O parlamentar destacou que o estado que lidera os casos de contaminação é o estado do Maranhão, em que há muitos conflitos envolvendo latifundiários de um lado e camponeses e indígenas de outro. "Isso é estarrecedor. Incusive porque o drone é uma tencologia de fácil acesso e que ainda é pouco regulado no país".
Em entrevista ao jornal Brasil de Fato, Valéria Santos, coordenadora nacional da CPT, afirma que somente no bioma Cerrado já foram identificados cinco tipos de agrotóxicos extremamente contaminantes e justamente em águas de cisternas e cacimbas utilizadas sobretudo por comunidades rurais, quilombolas e indígenas. Isso mostra que os casos de contaminação não são aleatórios, mas são estrategicamente pensados e articulados para atingir as comunidades que fazem resistência ao agronegócio.
"No Maranhão, houve um ataque químico numa comunidade em Buruticupu, onde foi pulverizado agrotóxico em cima da comunidade. Várias pessoas ficaram com queimaduras na pele, com coceira. Em várias comunidades, o pessoal tem percebido um adoecimento muito grande de pele, problema de vômito, diarreia, relacionados à questão dos agrotóxicos”, relata a representante da CPT. Segundo Valéria, mesmo nos locais que não são atingidos diretamente pela pulverização aérea de veneno, as comunidades têm enfrentado dificuldades para o cultivo de alimentos pelo nível de contaminação do solo, das águas e do ar.
Renato é autor da lei estadual 16.820, de 2019, também chamada de Lei Zé Maria do Tomé, que proíbe o despejo de agrotóxicos por aeronaves em território cearense. A lei foi pioneira no país ao tratar dessa temática e, questionada judicialmente por entidades ligadas ao agronegócio, teve sua constitucionalidade reconhecida em 2023 pelo STF. Diante da proibição, representantes do agronegócio no Ceará vem defendendo o uso do aparelho nas lavouras do estado.
"Nós temos uma lei que protege o Ceará contra esse tipo de coisa, que é a Lei Zé Maria do Tomé. Mas há aqueles que defendem a pulverização aérea por drones por aqui", explica o deputado. "Esses ataques onde se utilizam o drone como arma química contaminam crianças, contaminam idosos, contaminam as populações tradicionais e os mais vulenráveis. Isso é estarrecedor. E, ainda assim, há uma pressão de setores que já chegou a essa casa, por muitas portas, pra liberar drones aqui no Ceará".
Parlamento europeu e novo PL contra produtos banidos na Europa
Na semana que vem, Renato participa de uma conferência no Parlamento Europeu , realizada a pedido da bancada dos verdes alemães e da Fundação Heinrich Böll, para falar sobre a Lei Zé Maria do Tomé. A participação do deputado se deu a partir de convite feito pelo próprio Parlamento Europeu, juntamente com o Ministério Pùblico Federal brasileiro, o Ministério Público do Trabalho brasileiro e a Aliança Internacional para a Padronização de Agrotóxicos (IPSA).
Um dos objetivos do encontro é discutir a padronização do uso dos agrotóxicos no Brasil e na União Europeia. "O Brasil, além de permitir tecnologias que já são muito mais reguladas em outras partes do mundo, permite também a comercialização de produtos que são banidos em outros países. Portanto, nós estamos na contramão da saúde pública", defende Renato, que é autor do projeto de lei 841/2024, que veda a produção, comercialização e uso de agrotóxicos proibidos na União Europeia, no âmbito do Estado do Ceará.
"O Brasil comercializa muitos princípios ativos que estão banidos nos países da União Euoreia. Por que então o corpo do ser humano na União Euroeia é mais protegido que o corpo humano no Brasil?", questiona o parlamentar. "Porque há o interesse das grandes empresas transnacionais, duas das quais alemãs, de venderesm no Brasil e na AL aquilo que não podem vender na própria Alemanha. Portanto, nós estamos na luta por essa estandartização, para padronizar: aquilo que não pode ser vendido lá não pode ser vendido aqui".
(Texto: Felipe Araújo, com informações do Brasil de Fato / Foto: Freepik)