O dia 26 de janeiro guarda uma lembrança de dor e saudade. É, há oito anos, a data que rememora o assassinato de Ingrid Mayara Oliveira Lima, 18, e Igor de Andrade Lima, 16, mortos em uma ação policial durante uma festa de pré-carnaval no Bairro Ellery, em Fortaleza. Nesta terça-feira, 26, às 16h, uma manifestação vai marcar esses oito anos de luta por memória e justiça para Ingrid e Igor Andrade.
O ato também vai cobrar políticas públicas efetivas de proteção, acompanhamento e assistência às famílias de vítimas de violência policial. O momento será realizado no Parque Raquel de Queiroz, no Bairro Ellery, em Fortaleza. Participarão o Fórum Popular de Segurança, o grupo Mães da Periferia, o CEDECA, a associação do bairro Ellery, além de grafiteiros que farão uma homenagem a Ingrid.
Na ação desastrosa, o Comando de Policiamento Ronda do Quarteirão foi acionado para verificar uma denúncia de som alto no bairro. Em decorrência das festividades, o local se encontrava com grande aglomeração. Os policiais militares dispararam vários tiros. Ingrid Mayara foi atingida por dois tiros: um deles acertou a nuca e o outro, as costas da garota. O outro adolescente atingido, Ígor Andrade, levou um tiro na cabeça e chegou a ser socorrido para o Instituto Dr. José Frota (IJF), em Fortaleza, mas também morreu. Outras quatro pessoas também ficaram feridas.
A data não foi esquecida, especialmente pela mãe da adolescente, Sandra Sales. “A Ingrid estava lá para ajudar a minha mãe com as vendas de lanches”, conta Sandra. “Quero justiça para minha filha e desejo que não esqueçam o que aconteceu com ela”, reforça.
Infelizmente, o caso que aconteceu em 2013 apenas precedeu a escalada da violência institucional que seria registrada no Ceará nos anos seguintes. Apenas no período entre janeiro e agosto de 2020, por exemplo, foram registradas 112 mortes por intervenção policial no Estado, o que representa 82,3% de todas as ocorrências de mortes por intervenção policial no ano anterior.
Estatísticas disponibilizadas pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) mostram que abril de 2020 foi o mês em que foi registrado o recorde negativo de mortes por intervenção policial: 35 pessoas morreram, mesmo durante o período de isolamento social em decorrência da pandemia da Covid-19. A média é de mais de uma morte por dia.
O caso de Ingrid Mayara e Ígor Andrade não é um acontecimento isolado em termos de grande comoção pública. No ano passado, houve o caso Mizael Fernandes. O menino de 13 anos foi morto em uma operação do Comando Tático Rural, no município cearense de Chorozinho, na madrugada do dia 1º de julho.
“É necessária uma política de estado de maior acompanhamento e assistência às famílias de vítimas de violência policial, além de proteção emergencial, assistência psicológica e jurídica. Também é importante enfatizar a necessidade urgente de reparação e manifestação direta do alto escalão do Estado sobre esses casos, a exemplo do caso Mizael Fernandes”, destaca o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa, deputado Renato Roseno (PSOL).
Carta Aberta ao Governo do Estado
A Comissão dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa, juntamente com outras entidades da sociedade civil que atuam em defesa dos direitos humanos, se reuniu em novembro de 2020 com a vice-governadora Izolda Cela para tratar sobre o enfrentamento à violência policial no Estado. A reunião se deu após o envio de uma carta aberta da CDHC juntamente com outras 40 instituições ao governador do Estado, Camilo Santana, tratando sobre homicídios e mortes por intervenção policial.
Entre outros alertas, o texto enfatiza o papel do Estado na assistência e na garantia da proteção dessas famílias na apuração das ilegalidades cometidas pelas forças policiais. A carta pede ainda uma audiência com o governador e com a vice-governadora para tratar das políticas de segurança pública e penitenciária; e a garantia de investigações isentas sobre a morte de Mizael Fernandes; entre outros pontos.
"A CDHC é um espaço que está em contato direto com as famílias e vítimas de violência. Nós trabalhamos em prol da garantia de direitos de cada um deles, por isso a importância de que o Estado as receba e escute suas demandas", declara Roseno.