Há tipos de militâncias que são inatas em certas pessoas; que se externalizam desde sempre e se revelam facilmente ao longo de toda uma vida. Há outros tipos de militância, no entanto, que nascem a partir da identificação e da vivência. Foi nessa segunda que a agricultora Mônica Oliveira se reconheceu como uma defensora do direito à terra. Moradora do acampamento Zé Maria do Tomé, foi lá que ela descobriu o real sentido de liberdade e de luta. O acampamento não só a tornou defensora de sua própria existência, mas fez aflorar em Mônica a identificação com a mobilização e com a luta das mulheres. "O 8 de Março é uma data muito importante, porque nos lembra que devemos sempre motivar outras mulheres sobre o quão importante é resistir sendo mulher", ela afirma. Mônica é a terceira entrevistada na série especial produzida por nosso mandato nesta semana em que se celebra a luta internacional das mulheres. Na entrevista, ela fala sobre sua trajetória e sobre sua relação com o acampamento; e também defende um futuro "para os nossos filhos e netos com menos machismo e menos preconceito". (Texto e arte: Evelyn Barreto)
É TEMPO DE RESISTÊNCIA - Como você percebeu que suas ações estavam inseridas na militância? MÔNICA - A defesa do acampamento Zé Maria do Tomé foi minha primeira luta, militância, tudo... Antes disso, não conhecia nenhum tipo de movimento assim. Eu morava no Tomé quando iniciaram a montagem do acampamento e já fiquei curiosa. Fui conhecer já no segundo dia, após A instalação, e quando cheguei e vi todo aquele movimento, as pessoas, a organização, fiquei maravilhada. Fiquei ansiosa demais para me inserir, no dia seguinte já vim fazer parte, comecei a engajar outras pessoas na comunidade e foi a partir disso que comecei a me tornar parte. Fui participando da coordenação da comunidade, formando grupo de mulheres e hoje tenho plena certeza de que faço parte. Não me saindo daqui e não sei o que seria da minha pessoa se eu precisasse. Eu pelejo muito, às vezes me desanimo, sim, porque as coisas nem sempre são do jeito que a gente pensa, do jeito que a gente quer organizar. Afinal, somos uma comunidade coletiva com várias pessoas, várias cabeças pensando ao mesmo tempo. Mesmo diante de todas as dificuldades, não me vejo tendo que sair do acampamento, tendo que abrir mão dessa comunidade tão maravilhosa para mim.
É TEMPO DE RESISTÊNCIA - Que fatores são mais importantes para defesa de uma luta? MÔNICA - O que mais motiva a defender a existência do acampamento Zé Maria do Tomé é a liberdade e as possibilidades que vêm nesse cenário. Estamos aqui e temos o direito da moradia, a oportunidade de produzir nessa terra, produzir diferenciadamente. É uma grande vitória para a gente, que se a gente morasse lá fora, provavelmente seríamos explorados pelas empresas e, aqui, não. Aqui temos a garantia de produzir, a gente trabalha, se esforça bastante, mas quando a gente tá cansado a gente tem o direito de descansar, de estar dentro de casa. Podemos acompanhar o crescimento dos filhos por não estar trabalhando “exploradamente” nas empresas, sem ter hora de vir e de voltar. Eu acho que isso é um fator muito importante que precisamos continuar defendendo e que o acampamento nos traz: a liberdade de ir e vir. Vamos continuar lutando para nunca deixar essa bandeira cair, porque precisamos da terra para morar e produzir.
É TEMPO DE RESISTÊNCIA - Enfrentamos um ano de pandemia, de negação de direitos e de um governo que se retroalimenta do cenário de calamidade. Nesse contexto, o que precisamos destacar no 8M deste ano e de outros que estão por vir? MÔNICA - O 8 de Março é uma data muito importante, porque nos lembra que devemos sempre motivar outras mulheres sobre o quão importante é resistir sendo mulher. Enfrentamos diferentes dificuldades nesse último ano, pela dificuldade de realizar mobilizações, por causa da pandemia, mas não vamos deixar a data passar e ser esquecida. Temos de nos mobilizar mesmo na internet! Acho importante as mulheres se ajudarem pra isso; afinal, somos importantes na participação da sociedade. Acredito, até, que a gente deveria ter mais mulheres inseridas na política, porque somos mais sensíveis e empáticas, e poderíamos nos fortalecer mais. No Senado, na Câmara dos Deputados, a gente só vê homens, então, é um lugar que fica mais difícil e complicado para as mulheres, com essa dominação dos homens.
É TEMPO DE RESISTÊNCIA - Como você avalia a participação de mulheres em movimentos de defesa de direitos e garantias? MÔNICA - Mulheres militantes são heroínas, guerreiras. Acredito que devemos, sim, nos fortalecer e mostrar para todas as mulheres que elas são capazes de contribuir com a sociedade, que elas podem e devem ter suas opiniões e defendê-las. Todas são sempre bem-vindas aqui para construirmos um futuro melhor para todas nós. Um futuro para os nossos filhos e netos com menos machismo e menos preconceito, isso é o que nós devemos incentivar umas às outras, participar da luta, contribuir e mudar a sociedade.
É TEMPO DE RESISTÊNCIA - E para as que não estão inseridas, como convidá-las a participar desses movimentos? MÔNICA - Precisamos refletir sobre essa participação individualmente, até. Acho que quanto mais mulheres, mais fortalecimento do movimento. Diante da pandemia, temos muitas mulheres sofrendo, sendo vítimas de violência em casa e de tantas outras formas, como mulheres chefes de casa que passam necessidade devido à falta de auxílio financeiro. Esse presidente genocida, Bolsonaro, não liga para nós, mulheres. Então, precisamos nos unir mais ainda para conquistarmos esses espaços!