O impeachment de Dilma Rousseff foi consumado. Com o voto de 61 senadores contra 20, o Senado Federal pôs fim a um governo eleito por mais de 54 milhões de eleitores.
Por mais que insistam e comemorem os congressistas corruptos, monopólios da comunicação e o empresariado, o afastamento de Dilma é na verdade um golpe contra a soberania popular e a favor dos interesses das elites econômicas (banqueiros, industriais e agronegócio). Elites que esperam ansiosamente pela aplicação de um duríssimo ajuste econômico a favor de seus lucros e contra os direitos de milhões de trabalhadores e trabalhadoras.
O impeachment de Dilma não foi uma vitória da democracia: um golpe não deixa de ser golpe só porque foi aprovado por um congresso. Congresso, vale lembrar, corrupto e completamente surdo e cego às reivindicações e lutas das maiorias sociais. As marcas de nascença do governo de Michel Temer definem sua real natureza: golpista, antidemocrático e a serviço dos grandes empresários.
O “Fora Temer” não é só uma palavra de ordem dos defensores dos governos do Partido dos Trabalhadores (PT): é a tarefa central dos que não querem ver as conquistas populares serem atacadas, dos que reconhecem a necessidade de unir todos os segmentos explorados e oprimidos da sociedade brasileira em um grande movimento pela garantia dos direitos construídos e alcançados com muita luta.
A CRISE NÃO É SÓ POLÍTICA Não foram os decretos de crédito suplementar publicados sem a autorização do Congresso Nacional nem as pedaladas fiscais de Dilma o que derrubou seu governo. Ou as investigações da Operação Lava Jato. Dilma caiu porque não aplicou o ajuste econômico na extensão e velocidade exigidas pelos patrões.
A verdade é que embora tenham melhorado os indicadores sociais de pobreza, desde a chegada do PT ao governo federal, resultado especialmente do aumento do salário mínimo e de programas como o Bolsa Família, essas melhorias não passaram de migalhas diante dos lucros dos grandes empresários nos governos de Lula e Dilma.
Enquanto a economia brasileira andou bem, o empresariado tolerou Dilma, Lula e o PT. Nem o agravamento da crise econômica mundial, a partir de 2008, separou o empresariado dos governos petistas. A separação começou quando o ritmo de crescimento da economia brasileira começou a cair, com o fim do bom desempenho da balança comercial brasileira. Desde o inicio dos anos 2000, o país vinha se beneficiando dos elevados preços alcançados no mercado mundial pela chamadas commodities.
Nos últimos anos, entretanto, o preço dessas mercadorias caiu de forma rápida. O minério de ferro, por exemplo, despencou de US$ 187,18 a tonelada, em fevereiro de 2011, para US$ 37 em dezembro de 2015. O petróleo perdeu mais de 60% de seu valor e encerrou 2015 abaixo de US$ 40 o barril. Junto com isso, o PIB (Produto Interno Bruto) caiu de um índice positivo de 7,6% em 2010 para 3,8% negativos em 20015, arrastando para baixo a arrecadação de impostos, que caiu 17,5% entre 2013 e 2015 (de R$ 416 bilhões para apenas R$ 343 bilhões).
Na medida em que a economia piorava, cresceram também os gastos públicos, resultando num prejuízo bilionário, agravado pelo pagamento da dívida pública, que consumiu 42,4% do orçamento público nacional executado em 2015 (R$ 940 bilhões de R$ 2.218 trilhões). As taxas de desemprego explodiram, com a taxa de desocupação ultrapassando os 11% - somente no primeiro trimestre de 2016, 3,2 milhões a mais de pessoas passaram a procurar por uma vaga de trabalho em relação ao primeiro trimestre de 2015. Já a renda média dos trabalhadores caiu 4,2% em relação aos primeiros três meses de 2015. Ou seja, além da ameaça do desemprego, os trabalhadores e trabalhadoras que permaneceram no mercado de trabalho tiveram suas rendas reduzidas.
BARRAR OS ATAQUES AOS DIREITOS SOCIAIS E TRABALHISTAS Cento e setenta anos atrás, o principal crítico do capitalismo, Karl Marx, já percebera que o lucro dos empresários capitalistas é resultado da exploração econômica da classe trabalhadora. Sob condições favoráveis de crescimento econômico, os trabalhadores podem obter melhores salários e mais direitos. Mas logo que uma crise tenha início, esses mesmos empresários não vacilam em tomar de volta todas as migalhas que partilharam com os trabalhadores durante a época de fartura econômica. E é isso que estamos vendo no Brasil agora.
É esse o objetivo por trás da campanha que a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a União Democrática Ruralista (UDR), a Rede Globo e outras representações das elites brasileiras fizeram pelo impeachment de Dilma Rousseff e que segue, agora, com a pressão para que Temer e seu governo de golpistas aplique um programa econômico voltado para os interesses privados, que inclui:
Nova reforma da Previdência Social – Temer e o empresariado pretendem igualar a idade mínima da aposentadoria para homens e mulheres, inicialmente em 65 anos podendo chegar até aos 70 anos. Os trabalhadores e trabalhadoras que hoje tenham mais de 50 anos idade teriam regras específicas de transição.Todos os outros serão incluídos nas novas regras da Previdência.
Querem criar também um plano específico para o produtor rural, para que este passe a contribuir mais. Tencionam ainda rever todas as chamadas aposentadorias especiais, incluindo a de professores, policiais e militares, aplicando a estes as mesmas regras dos demais trabalhadores.
Reformas Trabalhistas – inclui uma “atualização” da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para atacar e flexibilizar direitos como férias e 13º, por meio de negociações setoriais e a regulamentação da terceirização, ampliando ainda mais essa forma de trabalho precário; e a regulamentação do Programa de Proteção ao Emprego (PPE), permitindo a redução de até 30% na jornada e no salário.
Emenda Constitucional 241 - Já encaminhada por Temer e aprovada na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, sua aprovação vai limitar os gastos públicos federais por 20 anos e acabar com a atual vinculação de gastos com saúde pública e educação, previstas na Constituição, assim como a realização de concursos públicos, além de praticamente inviabilizar reajustes anuais para os servidores públicos.
Ao todo, já estão tramitando no Congresso Nacional na forma de Projetos de Lei ou Medidas Provisórias, cerca de 50 propostas que terão consequências profundas sobre os direitos da classe trabalhadora, da juventude, das mulheres, de negros e negras, indígenas e LGBTTs. Não se trata apenas de desmontar todos os progressos assegurado pela Constituição de 1988, mas de regredir e desmontar os mais elementares e históricos direitos da classe trabalhadora brasileira.
PODER AO POVO: DIRETAS JÁ! O governo golpista de Michel Temer não tem nenhuma legitimidade para aplicar tantos ataques contra os direitos do povo. Seu programa econômico é o programa derrotado nas urnas em 2014.
Mas Dilma e o PT não são inocentes nesse jogo. Durante todos seus anos de governo, facilitaram o caminho dos golpistas por meio de alianças com bancadas e partidos reacionários, do silêncio diante do fortalecimento do fundamentalismo religioso e do avanço conservador, da opção pela manutenção da aliança com as classes dominantes em vez de atender a base social que diziam representar.
Deixaram de lado as reformas agrárias e urbanas, a democratização dos meios de comunicação, a demarcação das terras indígenas e quilombolas, facilitando a repressão estatal através da lei antiterrorismo, acelerando a destruição ambiental, abandonando ou atacando os direitos sociais de todos os setores explorados e oprimidos.
A hora é de construir uma alternativa a tudo isso e o FORA TEMER é o primeiro passo.
Mas não basta só afastar Temer. É preciso avançar na luta por transformações profundas e radicais na nossa sociedade e no nosso sistema político. É preciso devolver ao povo a decisão sobre o futuro político do país, por meio da realização de novas eleições gerais, sob novas regras. É preciso seguir lutando por uma saída anticapitalista para a crise econômica, enfrentando o desemprego e o arrocho salarial com medidas que garantam o pleno atendimento das reivindicações populares. A saída é pela esquerda!
GLOSSÁRIO:
Decretos de crédito suplementar - é um decreto que aumenta uma verba destinada a um determinado fim orçamentário. São permitidos mas precisam passar pelo congresso.
Pedaladas fiscais - O governo precisa repassar dinheiro para bancos, públicos e privados, que cuidam de programas e benefícios sociais, como o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, o seguro-desemprego e as aposentadorias públicas. Esse repasse é de responsabilidade do Tesouro Nacional. Ocorre que, nos últimos anos, o governo atrasou vários desses repasses. A suspeita é que os atrasos funcionariam como uma forma de cumprir as metas fiscais (ou seja, para não deixar as contas públicas no vermelho).
Commodities - é como são chamadas em inglês as mercadorias produzidas com pouco ou nenhum processamento industrial e negociadas amplamente no mercado internacional. São consideradas commodities as matérias-primas, minerais e gêneros agrícolas como soja, minério de ferro, petróleo bruto etc.
Vinculação de gastos - A constituição garante que um mínimo de orçamento vá para a saúde e para a educação, isso é a vinculação de receitas públicas no Brasil. É uma ferramenta utilizada para estabelecer uma ligação entre uma receita e uma despesa específica. Utiliza-se a vinculação quando o objetivo é dar prioridade a um determinado gasto público.
Nota do mandato É Tempo de Resistência (deputado estadual Renato Roseno - PSOL Ceará)