Entre 2005 e 2013, o número de infecções pelo HIV aumentou 11% no Brasil, segundo relatório da ONU (Organização das Nações Unidas). Os casos tornaram-se ainda mais frequentes entre os jovens de 15 a 24 anos. Ao todo, o Departamento de DST e Aids do Ministério da Saúde (MS) estima que aproximadamente 718 mil indivíduos vivam com HIV/Aids no Brasil, segundo dados de 2013.
Diante desse quadro e do atual cenário de cortes no orçamento das políticas voltadas à saúde e direitos humanos, o 11º Encontro Regional dos Movimentos Sociais de Luta Contra a Aids da Região Nordeste (ERONG/NE), que está sendo realizado em Salvador, no período de 12 a 15 de outubro, discutiu nesta terça-feira (13) os desafios para a garantia da integralidade e da promoção dos direitos na atual conjuntura.
O debate contou com a participação do deputado Renato Roseno (PSOL), que defendeu a necessidade de se reivindicar a manutenção da agenda de direitos humanos neste cenário de crise. O parlamentar cearense foi convidado para participar do evento, que tem como tema “Direitos humanos e assistência - Aids: 30 anos de epidemia, mas ainda morremos”. Renato esteve na mesa de discussão sobre “integralidade e promoção dos direitos humanos - desafios para manutenção e avanços no acesso aos direitos humanos das pessoas vivendo com HIV/Aids”
Analisando a situação brasileira, ele apontou que “há uma incompatibilidade da pauta de direitos com essa política econômica”. Roseno criticou a divisão da riqueza da União, que dedica mais de 40% do orçamento ao pagamento da dívida pública, a fim de beneficiar o capital financeiro, enquanto o Ministério da Saúde (MS) perdeu R$ 11,7 bilhões em 2015.
Na capital cearense, as pessoas soropositivas têm sofrido com dificuldades para acessar equipamentos como tomógrafos e, nos últimos meses, também enfrentaram a ausência de leite para crianças na rede pública de saúde. Ambas as situações foram denunciadas pelo deputado durante pronunciamento na Assembleia Legislativa, em agosto. A garantia do insumo para bebês de baixa renda é fundamental para evitar a chamada transmissão vertical do vírus (da mãe para o filho), pois substitui o aleitamento materno. Mesmo que a transmissão tenha sido evitada durante a gestação e o parto, por meio da profilaxia recomendada, a criança não deve ser alimentada com o leite da mãe soropositiva, uma das vias de transmissão do HIV.
Representando a Rede de Solidariedade Positiva de Fortaleza, Renê Herculano afirmou que “saúde é direito de todos e tem que ser garantido pelo Estado”. Para garanti-lo, ele defendeu que “é preciso nos unir para dar um basta às violações de direitos humanos, porque não é possível continuarmos morrendo por falta de leitos e UTIs (Unidades de Tratamento Intensivo) e de medicações necessárias”.
Além das políticas específicas, os participantes do debate destacaram a integralidade das políticas como fundamental para a garantia de direitos. Renê Herculano falou da expectativa de que “possamos um dia fazer parte concretamente da construção da política integral de saúde”. Uma política que, frisou ele, deve ser feita “para os que tanto dependem e necessitam dessa política”.
Outros desafios foram apontados pelos debatedores como urgentes. No campo dos direitos, é preciso reforçar o reconhecimento dos direitos humanos no país, mas também a promoção e a garantia deles. Esses dois últimos aspectos só poderão ser efetivados com luta e políticas públicas que concretizem aquilo que é apontado como fundamental à vida. Do mesmo modo, foi apontado como fundamental o fortalecimento de determinados sujeitos que reivindicam ações específicas, como é o caso das pessoas que vivem com HIV/Aids. “Isso revela uma opção ético-política de sociedade”, afirmou Roseno.
Falando do desafio das organizações da sociedade civil no momento atual, o parlamentar cearense argumentou que “o mundo que está sendo desenhado para as novas gerações é um mundo mais desigual. Nós estamos propondo reescrever o futuro. E só quem pode fazer isso é o ativismo político”. Nesse sentido, “nós temos uma sociedade que acabou por abraçar, ela própria, a lógica do mercado que a oprime, daí a importância de revitalizarmos movimentos sociais, organizações populares da sociedade civil na sua capacidade de crítica”. Afinal, não há direitos humanos que não sejam frutos da mobilização política.