De forma sorrateira, a portas fechadas e aproveitando-se do clima de distração da opinião pública em função da Copa do Mundo, os ruralistas conseguiram fazer valer a pressão do agronegócio e aprovaram na noite de ontem, na Comissão Especial da Câmara dos Deputados em Brasília, o projeto de lei 6299/02, também conhecido como "PL do Veneno". A proposta, de autoria do então senador Blairo Maggi (PP-MT), hoje ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo golpista de Michel Temer, recebeu parecer favorável do relator Luiz Nishimori (PR-PR) e foi aprovado por 18 a 9.
O sentido geral do projeto é flexibilizar as regras de fiscalização, aprovação, venda e controle dos agrotóxicos no Brasil. Entre outros pontos, a proposta exclui os ministérios da Saúde e o do Meio Ambiente do processo de análise e registro dos produtos. Com isso, as decisões ficam centralizadas apenas ao Ministério da Agricultura, que pode liberar licenças temporárias, sem que os agrotóxicos passem pelos testes devidos, e também restringir a proibição dos produtos apenas apenas as substâncias consideradas de "risco inaceitável".
Instituições como o Instituto Nacional do Câncer, Fio Cruz, Anvisa, ONU e MPF já se manifestaram contra o PL e alertam para graves danos à saúde pública e ao meio ambiente. Além disso, o movimento ambientalista e os movimentos sociais ligados à agricultura denunciam que o pacote beneficia as grandes empresas do agronegócio.
"O Brasil responde por 4% da produção agrícola mundial. Entretanto, concentra 20% do uso de agrotóxicos. Essa assimetria mostra como é poderosa em nosso país a articulação entre a indústria do veneno e a bancada ruralista, a mesma que garantiu a aprovação ontem do PL do veneno", denunciou Renato Roseno em pronunciamento na Assembleia Legislativa do Ceará na manhã desta terça-feira (26). Para Renato, a aprovação do texto tende a aumentar ainda mais o uso de agrotóxicos no País. "É farta a literatura médica que mostra os gravíssimo impactos dos agrotóxicos sobre a saúde pública e, em particular, sobre a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras rurais".
Renato é autor de um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa desde 2015 e que proíbe a pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará. Quase quatro anos depois, o texto ainda não foi a votação. "Essa é uma prática que já foi proibida na Europa, por exemplo. E insistimos em mantê-la aqui no Brasil e aqui no nosso estado", criticou. Além da pulverização aérea, o Brasil ainda utiliza uma série de substâncias que são proibidas nos países desenvolvidos - entre eles, princípios ativos já banidos em outros lugares - e também permite índices como o Limite Máximo de Resíduos (LMR) em proporções bem acima do que é aceito em outras legislações. "Todos nós somos afetados pelo uso de agrotóxico. Em particular, o campesinato e o agricultor rural, mas todos nós somos afetados", alertou.
Em 2015, o Instituto Nacional do Câncer (INCA) divulgou um documento em que coloca entre os efeitos associados à exposição crônica aos agrotóxicos problemas como infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema hormonal e câncer. O Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) mostra que, entre 1989 e 2004, foram notificados mais de um milhão de casos de intoxicação humana pelo venenos do agronegócio. Esse número é ainda mais alarmante porque, segundo a Organização Pan- Americana da Saúde (OPAS), para cada caso registrado de intoxicação por agrotóxicos ocorrem outros 50 sem notificação ou com notificação errônea.
"E a conta de toda essa contaminação vai para onde? Vai para o SUS!", alertou Renato, que apresentou dados de uma pesquisa da Fio Cruz do Paraná que revela que cada dólar usado no consumo de agrotóxicos gera 1,28 dólar de impacto na saúde pública em tratamentos de desintoxicação. Para o deputado, o setor ruralista tem patrocinado grandes retrocessos o Brasil. "Há uma propaganda veiculada numa grande rede de TV que fala que o 'agro é pop'. A verdade é que o agro está matando". (Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil)
Confira o pronunciamento na íntegra: https://bit.ly/2KrfpZm Saiba mais sobre o projeto de lei de autoria de Renato Roseno que proíbe a pulverização aérea no Estado do Ceará: https://bit.ly/2tvKp0D