A efetivação de políticas públicas que atuem na prevenção do homicídio de jovens é uma urgência para tirar o Ceará da primeira posição no ranking de estados que mais matam adolescentes no Brasil. Essa foi uma das constatações feitas durante audiência pública sobre assassinatos de jovens realizada na última terça-feira (13/11), no Complexo de Comissões Técnicas da Assembleia Legislativa.
A audiência fez parte da Semana Estadual de Prevenção dos Homicídios de Jovens no Ceará, que segue até o dia 17 de novembro com programação em diversos espaços em Fortaleza, Maracanaú e Juazeiro do Norte. A Semana foi criada a partir da lei 16.482, de autoria do deputado Renato Roseno (Psol), aprovada na AL em dezembro de 2017.
A audiência teve como encaminhamentos, especialmente para o poder público – tanto municipal, quando estadual – a cobrança por orçamento para a efetivação das políticas públicas e das recomendações do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência; o diálogo estratégico da sociedade civil com o governador Camilo Santana sobre o tema; relatório da implementação das recomendações do Comitê; o fortalecimento e ampliação da rede de atendimento às vítimas e a investigação dos homicídios de adolescentes.
RECOMENDAÇÕES DO COMITÊ - O deputado Renato Roseno indicou que, das 12 recomendações para a prevenção de homicídios propostas pelo Comitê, 10 podem ser executadas pelo Poder Executivo e, por isso, é necessário cobrar a efetivação.
Roseno indicou cinco pontos que precisam ser foco da atuação das políticas públicas, como sentido de urgência, capacidade de planejamento, pactuação, regularidade na tomada de ações e assertividade. O cenário enfrentado, lembrou, é de 514 adolescentes assassinados no Ceará no 1º semestre de 2018.
O vereador de Fortaleza, Guilherme Sampaio (PT), indicou que o trabalho do Comitê de Prevenção é um patrimônio do povo cearense e deu visibilidade ao extermínio juvenil. Segundo ele, é necessário denunciar a falta de uma ação mais decisiva do Poder Público. “As recomendações são elogiadas, mas não são efetivadas”, indicou.
Ele criticou ainda a falta de investimento do Poder Público nas parcerias com a sociedade civil, como projetos de cultura e arte que existem nos territórios em que os homicídios acontecem.
Mulheres do Movimento Mães do Curió compartilharam suas histórias de dor pela perda de filhos na Chacina do Curió, ocorrida em 2015 e de busca de justiça para as 11 pessoas assassinadas. “Sou mãe órfã, meu filho tinha 17 anos. Estou aqui por ele, mas para que não aconteça com outras mães”, comentou Suderli Pereira.
“Quantas mães estão na mesma situação que eu, que gostariam de tirar seus filhos dos túmulos? O alvo das mães que foram enterradas junto com seus filhos é só a justiça, conseguir estar viva por justiça, para que o Estado não mate mais nossos filhos”, afirmou Edna Carla Sousa, mãe de jovem vítima da chacina.
AÇÕES FUTURAS - O secretário adjunto da vice-governadoria, Domenico Abbate, indicou que o trabalho do Comitê é importante para programar ações futuras para o enfrentamento de temas tão complexos como a violência e os homicídios de jovens. Entre as iniciativas do Estado na prevenção, ele citou o programa “Nenhum aluno fora da escola” para prevenir a saída de jovens da escola e tentar a reinserção no ambiente escolar.
“Todas as críticas ao Estado são bem-vindas, para que ninguém possa nem por um segundo esquecer ou colocar em segundo plano toda a dor que vocês estão sentindo”, afirmou Abbate às mães dos jovens assassinados.
A titular da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus), Socorro França, relembrou o trabalho, enquanto titular da Controladoria Geral de Disciplina dos Orgaos de Segurança Pública (CGD), para dar uma resposta na investigação sobre a chacina do Curió, em 2015. “Trabalhamos para dar a resposta e espero que possam ver seus filhos serem justiçados”, comentou. Segundo ela, o Governo do Estado vem trabalhando para tentar minorar a violência.
Promotor do Ministério Público, Hugo Lucena reiterou a urgência em falar de orçamento e prioridade das políticas públicas na prevenção aos homicídios de jovens no Ceará. O promotor também citou que o Estado ocupa o segundo lugar no País na quantidade de suicídios entre jovens e esta é uma questão a ser melhor enfrentada com informações e fortalecimento das políticas públicas.
DIÁLOGO - Gina Moura, representante da Rede Acolhe da Defensoria Pública, relatou que a Rede surgiu da ineficiência do órgão em prestar assistência jurídica em casos como a Chacina do Curió. “A perda de um filho por uma entidade que deveria proteger é ainda mais doloroso”, afirmou. A defensora opinou que é possível ver um conflito de políticas públicas no Poder Público municipal e estadual. “Precisamos alinhar essas políticas, essas diretrizes, esclarecer qual diretriz assumida pelos poderes municipal e estadual. Precisamos de assertividade e eficiência”, complementou.
Ana Letícia Lins, representando o Fórum Popular de Segurança Pública, criado em 2017, afirmou que as vítimas e famílias das vítimas da violência precisam ser ouvidas, pois não são casos isolados. Ela elencou ainda quatro objetivos do Fórum: abertura de diálogo direto e permanente entre governador e sociedade civil para construir coletiva de ações e políticas; fomento da atuação integrada dos programas de proteção; cumprimento das recomendações do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência no Ceará e medidas de enfrentamento ao tráfico de armas e corrupção das polícias.
A audiência faz parte da programação da Semana Cada Vida Importa, uma realização do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência, Fórum DCA, Unicef, Fórum Popular de Segurança Pública, Assembleia Legislativa do Ceará, Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca), Movimento Cada Vida Importa e Governo do Estado do Ceará.
O Comitê lançou o relatório referente ao primeiro semestre de 2018 com dados, ações e mobilizações em parceria com outros órgãos e municípios para aprofundar a agenda de prevenção de homicídios de jovens. O relatório, assim como a programação da Semana, está disponível no site do Comitê. (Texto: Assessoria de Comunicação da AL / Foto: Marcos Moura)
[+] Confira trechos da audiência: https://bit.ly/2DE2Bw2