Projeto de lei que valoriza os músicos cearenses é discutido em audiência pública

27/08/24 15:17

A Política Estadual de Valorização e Justa Remuneração de Profissionais da Música Cearense, proposta a partir do projeto de lei 1044/2023, foi tema de audiência pública, na última segunda-feira (26), na Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Assembleia Legislativa do Ceará (CTASP/Alece). A iniciativa, de autoria do deputado estadual Renato Roseno (Psol), subscrito pela deputada estadual Larissa Gaspar (PT), quer garantir o pagamento do couvert artísticos aos músicos cearenses.

O projeto surgiu de uma parceria com o Sindicato dos Músicos Profissionais do Estado do Ceará (Sindimuce), que há mais de um ano discute o tema com os mandatos destes dois parlamentares. A ideia nasce, pois, a categoria, formada por cerca de 9 mil profissionais no estado, sofre com problemas históricos. O principal deles é a falta de uma remuneração justa aos artistas.

A partir disso, foi apresentado, em outubro do ano passado, o projeto de lei 1044/2023, que obriga o repasse do pagamento do couvert artísticos aos músicos cearenses ou o cumprimento do valor mínimo da tabela do Sindicato. “A aprovação vai enfrentar muitas barreiras. Nós vencemos a primeira, que é a Procuradoria da Casa, que é muito rigorosa, e deu parecer favorável. A matéria está pronta para votar nas comissões. A audiência pública serve para divulgar, aprimorar o texto e colocar em debate”, explica o autor da proposta.

Além disso, a proposta cria o selo “Estabelecimento Amigo da Música”, que reconhece equipamentos culturais públicos, privados, casa de shows, bares, restaurantes, festivais, pontos de cultura e outros empreendimentos que fortalecem os nossos artistas. “Eu quero valorizar aqueles que valorizam a música, que valoriza o trabalhador e a trabalhadora. Eles vão ter seu negócio, sua lucratividade e o músico vai ser importante para isso. Nós entendemos que a casa vai ganhar com isso”, enxerga Roseno.

A proposta

A iniciativa atualiza e amplia a Lei nº15.112/2012, que já regulamenta a oferta de serviços do tipo couvert artístico no Ceará. No entanto, havia algumas lacunas no texto em vigor sobre o repasse do couvert artístico e a remuneração do músico. A legislação atual trata, principalmente, de direito do consumidor, estabelecendo a previsão legal para a cobrança do couvert e a presença de cartazes bem visíveis no estabelecimento. Nela, há, por exemplo, a exigência da colocação de avisos com dimensões mínimas de 50 centímetros de altura e 40 centímetros de largura.

Se o projeto for aprovado, será garantido o pagamento mínimo de 90% do total arrecadado pela casa com couvert artístico ou o pagamento do valor de cachê fixo definido previamente como piso na Tabela de Cachês do Sindicato. O pagamento pode ser feito diretamente ao artista e/ou produtora por ele indicado. “Chegam para nós situações muito díspares. Artistas que sequer têm acesso à água potável durante o trabalho. É uma questão de dignidade humana”, reconhece Roseno.

Texto alternativo

Outro aspecto importante trata da transparência no fornecimento de informações pelos estabelecimentos contratantes sobre os valores cobrados aos clientes à título de couvert artístico e dos valores efetivamente repassados aos profissionais envolvidos na realização de apresentações musicais. Em outra ponta, a proposta quer garantir a salubridade das instalações destinadas ao exercício laboral e ao descanso/intervalo de jornada de trabalho dos profissionais da música nos estabelecimentos contratantes.

O compositor, produtor cultural e jornalista Dalwton Moura, vice-presidente do Sindimuce, reforça que o projeto nasceu após meses de diálogo da categoria, englobando toda a sua diversidade. “É um texto amadurecido por colegas das mais diversas expressões. É uma obra coletiva e busca contemplar, ter um caminho da remuneração mais justa. Se aprovarmos, vamos ter um salto gigantesco no nosso pagamento”, enfatiza.

Precarização

O presidente do Sindicato, Amaudson Ximenes, lembra que sua categoria vem sofrendo com a precarização das relações de trabalho, como o afrouxamento das leis, a inexistência de direitos trabalhistas, sociais e culturais. O músico expôs que a modalidade de contratação por aplicativo chegou ao universo musical. “À primeira vista, é uma excelente ideia para quem quer uma oportunidade e mostrar o trabalho. Depois começam a vir os problemas”.

O dirigente sindical exemplifica que há uma série de descontos, como a emissão de nota fiscal e valor debitado pelo aplicativo que afeta consideravelmente a quantia paga ao músico. Além disso, há o tempo de espera de recebimento do cachê, que varia de 15 a 45 dias. “Os músicos, não só destas plataformas, deveriam ter o reconhecimento da sua condição de assalariamento como os demais. A sua conversão em ‘prestadores de serviço’ serve para mascarar esta condição e fazer com que não tenham os direitos que, normalmente, o conjunto da classe trabalhadora tem como férias, 13º salário, descanso semanal, seguro saúde, entre outros”, expôs na audiência pública.

O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Ceará (Abrasel Ceará), Taiene Righetto, elogiou o aspecto do texto em ter como alternativa o cumprimento do pagamento da tabela mínima do sindicato ou o repasse de 90%. “Tira o problema de o músico tocar num dia que está vazio”. Ao mesmo tempo, reconhece que será um papel conjunto das duas entidades a disseminação e fiscalização da lei, caso seja aprovada. “As mãos dadas serão importantes para que isso funcione”, completou.

Encaminhamentos

Como encaminhamentos da audiência pública, foram sugeridas novas discussões das questões de ordem logística e operacional, como a garantia de estrutura de equipamentos e a operacionalização do pagamento, além das sanções em caso de descumprimento da lei. A deputada estadual Larissa Gaspar sugeriu uma reunião técnica com o Ministério Público do Trabalho (MPT) para levar as denúncias do Sindicato dos Músicos. Por fim, será elaborada uma emenda aditiva ao projeto de lei para acrescentar um prazo para o repasse do valor do couvert.

Áreas de atuação: Trabalho, Cultura