O mandato do deputado estadual Renato Roseno (Psol) enviou, nesta sexta-feira (27), um ofícío ao Ministério Público Federal (MPF) para que se investigue a possível saída ilegal de fósseis da Bacia do Araripe, que estão sendo comercializados nos Estados Unidos. O caso se tornou público, na última semana, quando um pesquisador encontrou mais de 200 peças, extraídas na região do Cariri, sendo vendidas por uma loja virtual do estado norte-americano de Missouri. Uma delas está custando US$3.900, o equivalente a quase 20 mil reais.
Outros ofícios também foram entregues à Polícia Federal e à Agência Nacional de Mineração (ANM), órgãos responsáveis pela fiscalização destes bens paleontológicos. Além da investigação, o parlamentar pede a responsabilização pela extração ilegal destes bens e que medidas sejam tomadas para que os fósseis retornem ao Brasil.
Os fósseis brasileiros são propriedade da União, a partir do Decreto-Lei Nº 4.146, de 1942. Ao contrário de alguns países, como o próprio Estados Unidos, a compra e venda desses achados, no Brasil, são proibidas. Sua extração depende da autorização prévia da Agência Nacional de Mineração — antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). A pena para quem comercializa as peças varia de um ano a cinco anos de prisão.
O caso ganhou repercussão a partir de uma publicação, no último dia 21, do biólogo e paleontólogo salvadorenho naturalizado brasileiro Juan Carlos Cisneros, da Universidade Federal do Piauí (UFPI). Ele foi responsável por encontrar um site, chamado Indiana9 Fossils - Prehistoric Fossils, que oferece fósseis — em sua maioria insetos e peixes — do período Cretáceo, que viveram há cerca de 108 milhões de anos.
Segundo a descrição da própria loja virtual, a coleção faz parte da Formação Crato da Bacia do Araripe e foi encontrada no município de Nova Olinda. No entanto, não informam como as peças foram parar ali. Além de uma libélula, que está custando US$3.900, ainda há peças que custam entre US$60 a US$3.120. “São fósseis raros e bem conservados de insetos que ainda mantém a pigmentação original e variações em suas asas”, detalha o professor e líder do Laboratório de Paleontologia da Universidade Regional do Cariri (Urca), Álamo Feitosa.
O artigo 216 da Constituição Federal ressalta que os fósseis são patrimônio cultural brasileiro e cabe ao Poder Público, com a colaboração da comunidade, promover sua proteção. “Além de patrimônios culturais e científicos, esses materiais são fonte de geração de renda, turismo comunitário e desenvolvimento social de base sustentável, atraindo visitantes do mundo inteiro para conhecer nossa riqueza paleontológica. É nosso dever protegê-los”, reforça Roseno.
Esta não é a primeira vez que fósseis do Ceará são flagrados sendo vendidos em lojas virtuais estrangeiras. O caso mais notório é de 2014, quando a paleontóloga Taissa Rodrigues, pesquisadora e professora da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) encontrou um anúncio de um esqueleto quase completo de pterossauro, o Anhanguera santanae, colocado para leilão por cerca de US$ 250 mil, por uma empresa localizada em Charleville Mézières, na França. Após acionar o MPF, uma longa investigação começou e, no início de 2019, o órgão anunciou que este exemplar e mais 45 peças serão repatriadas.
Caso o MPF tenha sucesso em uma nova repatriação, o paleontólogo Álamo Feitosa acredita que a coleção deve ficar sob a guarda do Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, em Santana do Cariri, gerido pela Urca, como aconteceu com um peixe fóssil que estava na Itália e foi entregue em maio do ano passado. “É notório que hoje o equipamento possui um dos principais acervos fossilíferos do Cretáceo da América Latina e uma reserva técnica com mais de 10 mil fósseis”, exalta o pesquisador.