Ao contrário do que foi anunciado na mensagem do governador ao poder legislativo no último dia 2 de fevereiro, o governo Camilo Santana (PT) ainda não possui um plano estratégico para a área de segurança. A denúncia foi feita pelo deputado estadual Renato Roseno (PSOL) em pronunciamento no plenário da Assembleia na manhã de hoje (8).
Segundo Renato, o que o governador apresentou como plano estadual de segurança pública é apenas o plano de ação elaborado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública para o programa Ceará Pacífico - e divulgado em dezembro do ano passado. "Há uma diferença gigantesca, operacional, conceitual, entre aquilo que se diz e aquilo que se faz. Nós estamos no último ano de governo e ainda não nos foi entregue um plano estadual", cobrou o deputado. "Não há um conjunto estratégico de curto, médio e longo prazo para inteligência, investimentos de promoção de base territorial e prevenção".
Enquanto isso, o Ceará segue trilhando um "caminho errado" em relação às políticas para a área. "O governo tem errado e tem se mantido no erro. Se o caminho estivesse certo, haveria redução na taxa de homicídios", denunciou Renato, que se apresentou na tribuna não como deputado, mas como estudioso e militante do tema da segurança pública e dos direitos da infância e da adolescência há mais de 20 anos.
"Eu quero que a segurança pública do nosso estado melhore. Porque as pessoas estão morrendo. E porque estão morrendo os nossos jovens, sobretudo os jovens negros das periferias urbanas", afirmou. "Eu não sou parlamentar, eu estou parlamentar. Mas sou alguém que milita nessa área e estuda o assunto. E que posso dizer: o caminho está. Ele aumenta o conflito armado. Mais pessoas morrerão".
GRUPOS ARMADOS - Em seu pronunciamento, Renato lembrou que quando as taxas de homicídios caíram em 2016, muito se falava numa trégua entre os diferentes grupos criminosos que se organizavam no Estado. O governo, entretanto, preferiu divulgar que aquele cenário era fruto do trabalho realizado pela secretaria de segurança. Em 2017, o pacto entre as facções explodiu e o governo não percebeu a tempo que a principal força desses grupos criminosos vinha da superlotação do sistema penal e penitenciário.
"Onde são recrutados aqueles que ingressam nos grupos armados? Sobretudo nas penitenciárias", explicou Renato. "O Ceará tem hoje cerca de 13 mil vagas em seus presídios, que possuem 28 mil ocupantes. Desse total, 60% são de presos provisórios e 55% tem menos de 29 anos. São, sobretudo, jovens". Em 2017, o Estado rompeu a barreira de 5 mil homicídios ao longo do ano, sendo quase mil de jovens. Em janeiro de 2018, o número de homicídios aumentou mais de 30% em relação ao mesmo período do ano passado.
"Nós estamos enterrando nossos jovens, estamos invertendo a pirâmide civilizatória segundo a qual as gerações mais novas enterram as mais velhas. Aqui, é o contrário. É uma irresponsabilidade geracional', definiu. "Trabalhar a prevenção é mapear aqueles que estão mais vulneráveis ao crime armado, aos homicídios. Prevenção se dá com sentido de urgência, decisão, planejamento, regularidade de implementação e pactuação com a sociedade. Sem essas cinco coisas, não há prevenção. E não há essas cinco coisas no governo Camilo Santana. Sobra apenas reatividade".
ZEIS - Para Renato, a atual crise é responsabilidade não apenas do governo Camilo Santana, mas também dos governos municipal e federal. Segundo o deputado, o que acontece no Estado é fruto do "desleixo, da desídia e da falta de planejamento" por parte do governo federal, que nunca conseguiu propor e efetivar uma arquitetura federativa em torno das políticas de segurança pública. E também é resultado da falta de investimento da gestão municipal em áreas como as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) em Fortaleza.
"Assuntos de enorme complexidade são pantanosos. Os mais afoitos podem ser seduzidos por uma lógica intempestiva, altissonante, simplificar com medidas reativas, problemas que são por si só muitos complexos. A segurança pública é um assunto desse tipo. É um dos assuntos mais complexos. Nela, porém, não cabem improvisos, não cabem medidas exclusivamente reativas, não cabe falta de planejamento", defendeu o parlamentar. "Não é um tema fácil, mas não podemos diminuir a enorme responsabilidade do governo Camilo Santana".
Renato lembrou que, desde 2009, o bairro das Cajazeiras, onde no último dia 27 ocorreu um chacina que vitimou 14 pessoas, é definido como uma ZEIS. "Assim como o Bom Jardim, o Vicente Pinzon. São dezenas de ZEIS na nossa cidade. Lá, deveria ter havido um conjunto de investimentos sociais por parte da prefeitura, na atual e nas gestões anteriores. Investimentos como um programa de regularização fundiára, a implementação de equipamentos esportivos e de cultura, equipamentos sociais, etc, como forma de garantir a inserção social e laboral dos jovens", cobrou.
De acordo com Renato, que é relator do Comitê Cearense pela Prevenção dos Homicídios na Adolescência, grupo de trabalho criado pela Assembleia Legislativa, pouco mais de 10 ruas do Bom Jardim concentram 25% dos homicídios no bairro. "Nada nessa área foi feito até agora. Não houve qualquer agenda de investimento em prevenção e em desenvolvimento humano", afirmou. "A qualidade da cidade e do espaço urbano oferecido para o jovem interfere de modo decisivo na segurança e nos indicadores de violência". (Foto: Agência Brasil)
[+] Confira vídeo com pronunciamento de Renato sobre a crise na área de segurança: http://bit.ly/2nTDk6E