"As mães de Maio, na Praça Argentina,/ Ergueram sua voz contra os tiranos,/ Que massacraram o povo feito insanos,/ Ditadores da América Latina.// As mães, em sua dor, se fazem ternas,/ Ao defender seus filhos são valentes,/ Com o coração partido seguem em frente,/ Sua fonte de coragem é eterna.// São as Clarisses, Lourdes e Marias,/ Xandas, Angélicas, Rocildas e Anas,/ Zerbinis, Socorros, Adas, Luzias.// Tantas são as mães de quem o povo se ufana,/ Combativas, amorosas e guerreiras,/ Nossas queridas mulheres brasileiras!"
Os versos escritos pelo médico Manoel Fonseca foram lidos em tom emocionando pelo deputado estadual Renato Roseno (PSOL) durante a sessão solene realizada na Assembleia Legislativa na noite da última terça-feira (3). O tema da solenidade foi o aniversário de 40 anos da Lei da Anistia. Para o parlamentar, ao mesmo tempo em que o evento prestava uma homenagem aos presos políticos que foram perseguidos, silenciados e torturados durante a ditadura civil-militar, também rendia uma homenagem especial às mães e mulheres que fizeram o movimento feminino pela anistia.
"Foram mães que, mesmo enfrentando o poder imperial, despótico, covarde, não se calaram, fizeram manifestações em praças públicas, na frente de cadeias, nas autarquias, nos tribunais, nas cortes, buscando os seus filhos, seus companheiros, seus maridos, irmãos e irmãs, denunciando internacionalmente que aqui havia um regime ditatorial que se escondia atrás do desenvolvimentismo de um pretenso milagre econômico que nada mais era que a acumulação capitalista da riqueza e do poder", afirmou Renato. "Foram esses homens e essas mulheres, em especial, que lutaram pela anistia".
A solenidade atendeu requerimento dos deputados Renato Roseno e Carlos Felipe (PCdoB). Foram homenageados 18 representantes de entidades como Instituto de Planejamento de Fortaleza; Partido Comunista Brasileiro; Movimento Feminino pela Anistia; Comitê Brasileiro de Anistia; Comissão de Anistia Wanda Sidou; Associação 64-68 Anistia; Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Arquidiocese de Fortaleza, além de mães de ex-presos políticos. O evento também contou com a apresentação do tenor Franklin Freire Dantas, que interpretou o Hino Nacional durante a abertura da sessão, e do coral Canto da Casa.
CONTRA O ESQUECIMENTO - De acordo com Renato Roseno, a conquista da Lei da Anistia, promulgada em 28 de agosto de 1979, representa um marco fundamental para a reconquista das liberdades civis e democráticas em nosso País. "A celebração dos 40 anos da aprovação assume um enorme significado, tanto para que não sejam esquecidos os crimes perpetrados durante o regime militar e não só por militares, mas também por civis apoiadores do regime de exceção, como para que tal episódio não se repita nunca mais na história do País”, afirmou.
A ideia, segundo o parlamentar, é também permitir um olhar para o nosso tempo, como forma de aprendermos, com a experiência da resistência à ditadura, a resistirmos aos desmandos e ao autoritarismo que novamente toma conta do país. Para Renato, o mundo e o Brasil hoje nos colocam desafios que sequer eram desafios previsíveis em 1968; mas a injustiça continua sendo o grande desafio do tempo presente.
"Vivemos hoje um tempo de desumanização e um tempo de barbárie. Por isso, as nossas lutas, profundamente humanistas, elas se renovam. É necessário que renovemos essa ética em que nos reencontramos com a nossa própria natureza, em que fundamos uma nova civilização", afirmou. "Nós vivemos uma crise civilizatória. Essa civilização do capital, contra a qual vocês lutaram há 50 anos vive agora os seus estertores. E ela nos convoca mais uma vez para dizer: precisamos lutar contra a barbárie e contra a desumanização".
De acordo com Renato, ainda é preciso buscar a verdade e responsabilizar os que cometeram crimes hediondos durante o regime autoritário. "É preciso lembrar que a Lei da Anistia anistiou também seus próprios agentes. Foi uma auto-anistia e não podemos esquecer os crimes perpetrados durante o regime militar”, salientou.
HOMENAGEM - O deputado Carlos Felipe enfatizou a necessidade de lembrar e homenagear os que foram prejudicados, presos e torturados pela ditadura militar. “Qualquer homenagem é pouco para aqueles que lutaram contra o regime autoritário”, disse. O parlamentar lamentou as diversas mortes e desaparecimentos além de reiterar a necessidade de justiça.
A ex-prefeita e ex-deputada, Maria Luíza Fontenele, agradeceu em nome dos homenageados e assinalou a tristeza dos que perderam familiares e filhos, que foram submetidos a um sistema sem respeito pela vida. “Lamentamos os que foram presos e torturados, mas não é apenas lamentar, é lutar. Avançar na consciência da batalha por uma sociedade humana, livre e diversa”, apontou.
A representante do Movimento Feminino pela Anistia (MPFA), Nildes Alencar Lima, frisou a relevância da Lei da Anistia que encerrou um período obscuro e também reiterou a importância de buscar mecanismos para uma sociedade democrática e justa.
O promotor de justiça, coordenador do Centro Operacional do Patrimônio Público, Élder Ximenes, parabenizou os que lutaram contra a ditadura militar. “São pessoas que aprenderam a defender a democracia através do sofrimento. Não podemos esquecer esse período já que ainda temos muito o que lutar. Hoje, defender uma sociedade livre, justa e igual é revolucionário. É triste que o óbvio seja revolucionário”, apontou.
Durante o evento, houve apresentações do coral Canto da Casa e do tenor Franklin Freire. Estavam presentes ainda durante a solenidade os deputados Augusta Brito (PCdoB) e Elmano Freitas (PT); a secretaria de Proteção Social, Justiça, Mulheres e Direitos Humanos do Estado, Socorro França; o defensor público, representando a Defensoria Pública Geral do Estado, Eduardo Antônio Villaça; a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará (OAB/CE), Ana Virginia Porto; a advogada e ex-conselheira da Comissão de Anistia, Rita Maria de Miranda; o presidente do Instituto de Planejamento de Fortaleza e ex-preso político, Eudoro Santana e o presidente da Comissão de Anistia Wanda Sidou, Mario Miranda de Albuquerque. (Texto: Felipe Araújo, com informações da Ascom-AL / Foto: José Leomar)