Um cenário "alarmante". Assim o Unicef classificou as estatísticas de homicídios de adolescentes no Brasil. Principalmente no Nordeste, região que passou a concentrar o maior número de casos e onde o Ceará lidera as estatísticas. Os dados foram divulgados no último dia 11 através do relatório Índice de Homicídios na Adolescência 2014 (IHA), resultado de uma parceria entre o UNICEF, o Ministério dos Direitos Humanos (MDH), o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj).
A pesquisa analisou os homicídios de adolescentes entre 12 e 18 anos nos 300 municípios brasileiros com mais de 100 mil habitantes. De acordo com o IHA, para cada mil adolescentes, 3,65 correm o risco de ser assassinados antes de completar 19 anos. A se manterem as condições diagnosticadas em 2014, cerca de 43 mil adolescentes poderão ser assassinados entre os anos de 2015 e 2021. "O que temos visto hoje no Brasil é que a falta de oportunidades tem determinado cruelmente a vida de muitos adolescentes", defende Florence Bauer, representante do UNICEF no Brasil.
Segundo Florence, enquanto o Brasil, nas últimas décadas, conseguiu reduzir a mortalidade infantil significativamente, o número de mortes entre os adolescentes cresceu de uma maneira "alarmante". As mortes de crianças menores de 1 ano foram reduzidas de 95.938, em 1990, para 37.501, em 2015. Durante o mesmo período, o número de adolescentes de 10 a 19 anos assassinados aumentou de 4.754 para 10.290, segundo o Datasus. "É primordial que o País valorize melhor a segunda década de vida e dê à adolescência a importância que ela merece", afirmou.
Para o deputado estadual Renato Roseno (PSOL), que repercutiu os números no plenário da Assembleia, a situação, em termos estatísticos, é equivalente à queda de um avião lotado com 180 adolescentes a cada três dias no Brasil. "São nada menos do que 60 jovens mortos diariamente em nosso país, uma catástrofe social que fez com que o Unicef classificasse a situação brasileira como 'assustadora'. E, em particular, a situação de Fortaleza e do Ceará, respectivamente, a pior capital e o pior estado em termos de matança de jovens", defendeu o parlamentar, que é relator do Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência.
Das dez capitais mais violentas para um adolescente, sete estão na Região Nordeste. Fortaleza tem o maior IHA, com 10,94 homicídios para cada grupo de mil adolescentes, seguida por Maceió (9,37). As cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo registraram a 19ª e a 22ª posição entre as capitais (2,71 e 2,19, respectivamente). Entre os estados, o Ceará lidera o ranking, com IHA de 8,71; em segundo lugar aparece Alagoas, com 8,18. O número de adolescentes mortos no Ceará em proporção à população é quase 10 vezes maior que o do estado que aparece com o índice mais baixo, Santa Catarina, com 0,93.
O cálculo dos riscos relativos atesta a influência de sexo, cor, idade e meio utilizado no homicídio na probabilidade de um adolescente ser vítima de violência letal. Em 2014, os adolescentes do sexo masculino tinham um risco 13,52 vezes superior ao das adolescentes do sexo feminino, e os adolescentes negros, um risco 2,88 vezes superior ao dos brancos. O risco de ser morto por arma de fogo é 6,11 vezes maior do que por outros meios.
Outro estudo conduzido pelo UNICEF, em parceria com a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e o Governo do Estado do Ceará, o relatório "Trajetórias Interrompidas" traz uma análise de homicídios ocorridos em Fortaleza e em outros seis municípios cearenses, com conclusões semelhantes. O documento foi produzido pelo Comitê Cearense pela Prevenção de Homicídios na Adolescência. As vítimas eram, em grande maioria, meninos (97,95%) e negros ou pardos (65,75%), moradores das periferias. Os adolescentes assassinados eram, em sua maioria, pobres – 67,1% viviam em lares com renda familiar entre um e dois salários mínimos – e 70% estavam fora da escola há pelo menos seis meses. Em Fortaleza, metade dos homicídios de adolescentes aconteceu em média a 500 metros da casa da vítima.
Segundo o Unicef, o enfrentamento dos homicídios de adolescentes é uma prioridade da entidade em seu programa de cooperação com o governo brasileiro para o período de 2017 a 2021. Entre as ações desenvolvidas, está a Plataforma dos Centros Urbanos, que é implementada em dez capitais brasileiras – Belém, Fortaleza, Maceió, Manaus, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Luís, São Paulo e Vitória. O UNICEF trabalha em parceria com os municípios na promoção de políticas e estratégias intersetoriais de prevenção da violência e garantia de direitos fundamentais, como educação de qualidade e participação de adolescentes.
Confira pronunciamento de Renato sobre o tema: https://www.facebook.com/RenatoRoseno50/videos/1886033604741983/