Nossa solidariedade ao ator e jornalista Ari Areia que tem sido vítima de perseguições e criminalizações que visam reprimir a sua atuação no monólogo “Histórias Compartilhadas”. A peça trata de histórias de homens impedidos de terem reconhecida sua identidade gênero e viverem sua transexualidade. A polêmica gira entorno da cena em que o ator pinga sangue na imagem de Jesus crucificado.
Votamos "não" ao requerimento. O Deputado Estadual Renato Roseno (PSOL) justificou seu voto: "Lamento uma instância estatal, em uma democracia, votar qualquer moção de opinião - de aplauso ou de repúdio - a uma obra artística movida por convicções de ordem privada. É preciso resguardar, inclusive, o direito à esfera privada, o direito à liberdade artística, tendo em vista que se trata, sobretudo, de uma expressão do parlamento, que vai expressar à sociedade cearense que estaria repudiando, por motivos de ordem religiosa, uma expressão de liberdade artística que, inclusive, boa parte, dos deputados e deputadas, sequer viu. Eu vi a peça, fiz questão de assistir, em meio à essa polêmica toda - ela não desrespeita qualquer religião, ao contrário, ela faz, como já foi feita, uma alusão ao sofrimento e ao preconceito. Não cabe à nós, parlamento, qualquer tipo de moção crítica como essa. Inclusive isso vai ser tomado como uma censura e isso nós não aceitaremos. Em nome da independência, em nome da liberdade, nós encaminhamos contrários a essa votação, defendemos o Estado Laico", afirma o parlamentar do PSOL, Deputado Estadual Renato Roseno. A votação foi finalizada com 24 votos favoráveis ao requerimento de moção de repúdio e apenas 3 votos contrários, sendo um nosso.
Nosso mandato defende o Estado Laico e as liberdades. O Estado não deve fazer julgamentos sobre atividades artísticas a partir de um viés religioso. Tal atitude configura uma quebra irremediável do princípio da laicidade. Em um Estado Laico, as autoridades públicas devem se nortear por valores constitucionais como a proteção da liberdade de crença e, não em exaltação ou favorecimento de qualquer credo específico.
Todos os dias, em nome de discursos de ódio atribuídos à diferentes matrizes religiosas, seres humanos são agredidos, por sua identidade de gênero ou orientação sexual. Não deve ser papel do Estado assumir um discurso de uma maioria ou de uma minoria. O papel do Estado é assegurar os direitos de todas as pessoas independente de raça, gênero, etnia, religião, orientação sexual, identidade de gênero, enfim, os direitos de todas as pessoas.
Nosso mandato defende as liberdades. Lutamos pelo direito individual de crença e, isso só pode ser assegurado se o Estado não tiver preferência por nenhuma religião, além de dever tratar à todas de forma isonômica. Só um Estado Laico é capaz de assegurar a liberdade de crença e, portanto, promover uma convivência pacífica entre os cidadãos independente da religião professada por cada um.
Essa faceta religiosa e conservadora tem se manifestado em manifestações públicas de ódio às mulheres, pessoas lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e travestis (LGBTs), pessoas negras e indígenas, adolescentes acusados de ato infracional ou adultos acusados de crime. Esses grupos têm sido alvo constante de ataques por parte de pessoas adeptas de um tipo de conservadorismo político que busca reinterpretar e instrumentalizar a linguagem religiosa no sentido de legitimar o discurso de ódio e intolerância. Não satisfeitos com a tentativa de naturalização desse discurso, esses conservadores buscam também legalizar a prática, conforme se depreende do projeto de “Estatuto da Liberdade Religiosa” promovido por essa corrente:
“Não se considera crime, na forma de discurso de ódio, a pulgação, na esfera pública ou privada, de ideias de uma religião contrárias a um determinado comportamento social ou mesmo crença de um determinado grupo, religioso ou não, desde que feitas pacificamente, com urbanidade, tolerância e respeito aos direitos humanos fundamentais.” (art. 9, § 2º).
Aprofundando o debate, convidamos para o seminário sobre "Estado Laico e Intolerância Religiosa" a ser realizado no dia 7 de julho, às 15h, na Assembleia Legistaiva do Ceará com a presença de Ivanilda Ferreira, relatora de Direitos Humanos e Estado Laico da Plataforma Dhesca Brasil.